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Trabalho

- Publicada em 31 de Maio de 2010 às 00:00

Procura-se um lugar ao verde


André Netto/JC
Jornal do Comércio
Eles são aproximadamente 2,6 milhões, ou 14%, dos postos de trabalho formais no País. Não pertencem a uma atividade econômica específica, porém, a sua relevância lhes rendeu designação própria: empregos verdes. O grupo, que abrange profissionais de diversas áreas, representa um segmento ainda novo, mas em constante ascensão. Tudo graças à exigência de um mercado preocupado com a imagem e o futuro do planeta na era da sustentabilidade.
Eles são aproximadamente 2,6 milhões, ou 14%, dos postos de trabalho formais no País. Não pertencem a uma atividade econômica específica, porém, a sua relevância lhes rendeu designação própria: empregos verdes. O grupo, que abrange profissionais de diversas áreas, representa um segmento ainda novo, mas em constante ascensão. Tudo graças à exigência de um mercado preocupado com a imagem e o futuro do planeta na era da sustentabilidade.
Cada vez mais, empresas de diversas áreas e portes agregam ao quadro de funcionários pessoas que, direta ou indiretamente, trabalham como protagonistas na preservação e manutenção do meio ambiente. O relatório publicado em 2009 pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostra um aumento pequeno, porém constante, da oferta desse tipo de emprego. As taxas de crescimento de postos oferecidos por essas atividades têm se mantido acima das dos empregos formais em toda a economia.
Apesar dessa ascensão, o vice-presidente de sustentabilidade da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), Ézio Rezende, afirma que no Brasil essa busca é pouco significativa, o que deve ser revertido em longo prazo, quando as empresas terminarem de se reestruturar em relação ao tema. “Estamos ainda fechando um processo de conscientização e começando a olhar para fora”, aponta. Ele lembra da mudança de paradigma nos processos de seleção, que da prioridade ao QI (quociente de inteligência) dos candidatos passou a considerar o chamado QE (quociente emocional). O próximo passo, já verificado em várias instituições, é a percepção da inteligência ecológica de quem concorre a um posto de trabalho.

A pouca qualificação dos profissionais, no entanto, é um entrave mesmo para as poucas vagas existentes. A oferta de especializações é a alternativa para os interessados na área, já que são poucas as faculdades que oferecem uma formação em sustentabilidade na graduação. O curso de Ciências Econômicas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs) foi um dos poucos que apostou na tendência. Desde a inserção do assunto no seu projeto pedagógico, em 2005, a instituição aumentou em 100% as vagas para a graduação devido ao aumento do interesse pelos estudantes. O tema é abordado nos oito semestres de duração do curso em matérias como Desenvolvimento Social Sustentável e Economia da Sustentabilidade.

“Estamos começando a caminhada no meio acadêmico de forma tímida. O que mais vemos são seminários e atividades extracurriculares”, avalia Rezende. A fundadora e diretora-técnica da Arcadis Tetraplan, Lídia Biazzi Lu, que percebe na sua empresa de consultoria ambiental essa dificuldade em processos de seleção, esclarece que somente a demanda no mercado tem a capacidade de criar novas especializações acadêmicas. A solução encontrada pela Arcadis é a capacitação interna. Mesmo sem terem algo específico no assunto, ela garante que não faltam vagas aos interessados. “É um trabalho interessante e politicamente correto”, justifica a diretora.
Porém, para chegar a esse patamar, é preciso mais do que interesse. Conforme Rezende, um profissional verde deve ter uma visão mais sistêmica e ampla do mundo, a fim de reinventar o processo de trabalho. Soma-se a isso a criatividade, a disposição de se renovar e a facilidade de liderar e comunicar. “São pessoas que, por essa visão e comprometimento com o que está em volta, acabam por se posicionar da mesma forma em suas atividades na empresa. Além disso, ele acaba por contemplar mais aspectos que um profissional comum”, esclarece.
Uma das primeiras empresas a anunciar uma vaga no Green Jobs (portal que, desde o início do ano, permite que empresas brasileiras divulguem vagas na área), a Arcadis Tetraplan agrega as mais diversas áreas de atuação como geólogos, biólogos e mesmo historiadores e sociólogos. Todos apresentam um perfil em geral jovem e de formação multifacetada, com flexibilidade suficiente para se dividirem entre o escritório e a caatinga.

Crescem setores que ajudam a reduzir frota de veículos

Por auxiliarem na diminuição da queima de combustível, segundo maior responsável pelas emissões de carbono, algumas empresas se tornaram sinônimo de sustentabilidade. No entanto, isso muitas vezes é feito de forma não intencional. É o caso de manutenção e reparação, transportes coletivos e alternativos e telecomunicações e teleatendimento.
Somado, esse grupo totalizou, em 2008, aproximadamente 1,6 milhão de profissionais. O cálculo, porém, é estimado, pois não inclui grande parte de trabalhadores autônomos e pequenas oficinas.
Telecomunicações e teleatendimento diminuem distâncias sem que as pessoas precisem sair às ruas. Já a possibilidade de transportar uma grande quantidade de passageiros e cargas faz do setor de transportes o responsável por 800 mil trabalhadores, sejam eles motoristas ou administradores.
Responsável por cerca de 50% da carga transportada no País, as rodovias são vilãs quando, em geral, se trata de sustentabilidade. O tratamento verde é dado aos profissionais do ramo que contribuem, de uma maneira ou de outra, para a substituição desse tipo de veículo, assim como dos aviões, no deslocamento de passageiros e cargas. A consideração dada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), no entanto, leva em conta outro viés. Apesar de serem grandes poluidores, a organização considera o capacidade de criar condições para retirar de circulação um bom número de automóveis.
A Carris, responsável pela frota de 351 ônibus em Porto Alegre, leva em média 1,5 milhão de passageiros por dia. A primeira empresa a usar biodiesel em transporte público no Estado transmite essa preocupação para os seus 1.600 trabalhadores. Por não poderem escolher funcionários com visão para a sustentabilidade, pois a seleção é feita por meio de concurso, uma vez por ano eles recebem capacitação na área. Já a escolha de fornecedores e prestadores de serviço segue à risca essa premissa, que faz parte da política da empresa.
Engenheiro civil, o presidente da Carris, João Pancinha, procura se atualizar constantemente na temática ambiental. Com isso, ele conhece o papel fundamental de uma empresa de transporte público na era da sustentabilidade. “Quanto maior a qualificação da frota, melhor é o serviço e mais passageiros podem ser transportados”, reflete o presidente, que projeta a colocação de mais 62 veículos nas ruas da Capital até julho.

Preservação de recursos naturais gera mais vagas

Atividades baseadas na exploração de recursos naturais apresentam, cada vez mais, um grande potencial na geração de empregos verdes. Extração mineral, construção civil, agropecuária e até mesmo turismo estão entre os 42 grupos de atividades que, conforme a Organização Internacional do Trabalho (OIT), tentam recuperar o impacto ambiental que causam. Grande parte delas tem tentado compensar os danos com o aumento no quadro de funcionários voltados para a manutenção e recuperação daquilo que deterioram.
A emergência de restauração dos danos torna o potencial de crescimento a curto prazo desses empregos muito promissor. Nesses setores, a introdução de mudanças nos processos de produção é indispensável. Em 2008, conforme o relatório da OIT, aproximadamente 6 mil empregos verdes foram oferecidos nesse grupo. Eles representavam 14,73% dos empregos formais totais, um aumento de quase 10% em relação ao ano anterior.
A preocupação com a sustentabilidade vem sendo prioridade em empresas relacionadas à exploração e refinamento de petróleo. Na Braskem, o projeto Eteno Verde, que utiliza a cana-de-açúcar como matéria-prima, já envolveu, desde 2007, mais de 2,2 mil trabalhadores somente na construção da planta, que deve começar a funcionar no terceiro trimestre desse ano. Depois de pronta, serão 50 funcionários nesse local, além de mais 100 em outras duas plantas, onde será feita a transformação de eteno em plástico.
O gerente do projeto, Sérgio Gomes, não esquece de agregar como colaboradores verdes todos aqueles com ligação indireta, como a equipe de vigilância, refeição e transporte. Numa extensão ainda maior, a OIT considera, nesse caso, os mais de dez clientes que compram o plástico para seus produtos, e os produtores da cana-de-açúcar. Prova de que a atividade em uma só empresa proporciona que o número de empregos verdes forme uma grande rede e siga em constante crescimento.
Há 15 anos na petroquímica, o coordenador de produção da planta de Eteno Verde, Eder Felipetto, candidatou-se à vaga que hoje ocupa porque já tinha uma visão para a sustentabilidade. Sempre procurando se atualizar sobre o assunto, ele se diz agora ainda mais proativo. “Não vivo mais só o hoje, vivo pensando no amanhã”, afirma. Na escolha dos funcionários com quem vai trabalhar, Felipetto leva em conta a visão deles em relação à sustentabilidade.
Na refinaria Alberto Pasqualini (Refap), cujos mesmos princípios levaram a uma diminuição de 50% dos impactos, enquanto a produção aumentou 50%, três novos cargos foram incluídos no processo seletivo: engenheiro ambiental, técnico ambiental e analista ambiental. Para o gerente de segurança e meio ambiente da Refap, Antonio Ricardo Lanfredi, os novos profissionais estão fazendo a empresa ampliar o foco em meio ambiente, negócios e comunidade.

Foco é a preservação dos recursos naturais

Tentar consertar os danos alheios é a função de quem trabalha em atividades como produção e manejo florestal, geração e distribuição de energias renováveis e reciclagem. Nessa última, predomina o trabalho informal. Além dos postos registrados formalmente, estima-se em 1 milhão o número de vagas oferecidos pelo setor, conforme dados do Compromisso Empresarial Pela Reciclagem (Cempre). Já o Movimento Nacional dos Catadores de Rua calcula em 110 mil o total de trabalhadores organizados em cooperativas voltadas especificamente para essa finalidade.
Somente no setor de energias renováveis, atualmente existem 2,3 milhões de empregos entre produção da cana-de-açúcar, fabricação de álcool e participação em obras para geração e distribuição de energia elétrica. A expectativa é que essa nova mentalidade ajude a mudar a má fama do setor, já que muitas empresas do ramo utilizam mão de obra precária e até mesmo de trabalhadores em situação análoga à escravidão. As estimativas são de que o setor chegue à marca de 20 milhões de trabalhadores em 2030, e a expectativa é que todos estejam em situação regular e com boas condições de trabalho. Na agricultura, a OIT calcula que 12 milhões de novos postos de trabalho surjam para a produção de biomassa.
A quantidade de empregos oferecidos poderia ser ainda maior. No entanto, além da informalidade, nem todas as atividades econômicas se encaixam nos critérios de empregos verdes. É o caso, por exemplo, dos postos gerados pelas atividades ligadas à fabricação e comercialização dos veículos movidos a álcool e a gás natural, que não puderam ser isolados dos demais empregos mantidos pelo setor automotivo em função da organização.
Fernanda Neves faz parte dessas estatísticas há um ano. Pertencente a uma profissão que nem sempre se relaciona com a sustentabilidade, apesar de lidar com o ambiente e a sociedade, ela abandonou a sala de aula para se dedicar ao mapeamento da Usina Hidrelétrica de Jirau, em Rondônia. Quando entrou na empresa para trabalhar na área de produção de etanol, Fernanda não imaginava que, no setor de flora e fauna do projeto que trabalha atualmente, a parceria com biólogos e veterinários lhe expandiria tanto os horizontes. “Essa diversificação vai dando cada vez mais uma noção ampla do que é ser geógrafo”, comenta.
Outros geógrafos trabalham na empresa com linhas de transmissão, geografia humana, aplicação de programas e estudo de impacto ambiental. Interessada em consultoria ambiental desde a faculdade, ela relata que, ainda que o aprendizado venha na prática, a formação acadêmica em geografia não tem muita atenção para com a sustentabilidade. A solução foi atualizar-se, o que deve, segundo ela, ser feito constantemente por quem deseja se dedicar ao meio ambiente. Ler as notícias publicadas diariamente em jornais e ter flexibilidade para um trabalho nada tradicional muda o ritmo de vida e exige paixão, o que a geógrafa garante ter.
A IBFlorestas é outra das empresas que, para aumentar os índices, anunciou a vaga para representante de mudas e sementes nativas na página Green Jobs. “A chance de se obter sucesso anunciando nessa página é maior, porque lá podemos encontrar alguém com interesse focado nessa área. Fica mais fácil estabelecer uma parceria”, explica a gerente de projetos do instituto, Juliana Placidi.
Como as demais instituições que se encaixam nessa classe, todos os empregados são considerados verdes. São 55 pessoas, entre o escritório e o viveiro, considerado o maior de mudas nativas do País. “Cada vez mais os interessados nas vagas já trazem uma bagagem na área. E esses profissionais podem agregar mais para a empresa”, acrescenta Juliana.
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