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Porto Alegre, quinta-feira, 10 de maio de 2018.

Jornal do Com�rcio

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H�lio Nascimento

Cinema

Not�cia da edi��o impressa de 11/05/2018. Alterada em 10/05 �s 17h54min

Cenas de uma ditadura

H�lio Nascimento
Em um dos documentários que realizou sobre a passagem de Orson Welles pelo Brasil, durante o regime do Estado Novo, Rogério Sganzerla utilizou uma gravação da entrevista que o diretor de Cidadão Kane realizou com o então chanceler Owaldo Aranha. Em tal gravação, feita para uma rádio norte-americana, o cineasta não esconde seu fascínio pelo ministro brasileiro. Em palavras dirigidas ao povo norte-americano, Welles pergunta se o ouvinte sabe o que é um gaúcho. E ele mesmo responde, pronunciando gaúcho, e não "gaucho", como fazem os norte-americanos, e assim mostrando que sabia localizar perfeitamente as origens do entrevistado, referindo-se a Aranha: "Conversando com ele se percebem a cultura e a inteligência, e ao mesmo tempo se ouve o retinir das esporas". Numa frase, o realizador de Soberba resumiu e definiu toda uma temática que se faz presente em Imagens do Estado Novo, documentário de Eduardo Escorel, na qual são utilizados, na maior parte do tempo de projeção, cinejornais produzidos pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). As palavras de Welles são simpáticas, mas revelam contradições e devem ser lidas menos como uma definição dos nascidos no Rio Grande do Sul do que como a constatação de que a rudeza e mesmo a violência nem sempre são devidamente encobertas pelos sinais da civilização. Ao pronunciá-las, o cineasta estava colocando um tema que não chega a ser plenamente desenvolvido por Escorel em seu documentário, um trabalho que, por vários motivos, merecia um público bem mais amplo do que aquele que vem registrando nas bilheterias brasileiras.
O grande astro do filme, como não poderia deixar de ser, é Getúlio Vargas. Mas Escorel não deixa de salientar que alguns coadjuvantes exerceram, por sua vez, papel mais importante do que o protagonista. Um deles, claro, é Aranha, que foi capaz de chamar Francisco Campos de "um anormal" e que foi uma voz discordante de alguns métodos então empregados. O episódio relacionado à entrada de judeus no Brasil é resumindo no filme de maneira um tanto superficial. No livro fotobiográfico sobre seu avô, Pedro Corrêa do Lago dedica um espaço bem maior ao assunto. Mas como esta é matéria de historiadores, fica o registro como prova de que o documentário tem entre seus valores despertar o interesse por temas e acontecimentos. Um dos objetivos do filme de Escorel é mostrar como imagens podem ser manipuladas e também servir para omitir passagens relevantes. Por isso, parece importante para um realizador não se movimentar no mesmo ritmo. Um exemplo é a pouca relevância que o levante militar de 1935 tem no filme, quando foi o acontecimento que deflagrou um processo que iria anular as eleições presidenciais e a instalação da ditadura. Luís Carlos Prestes, por sinal, é focalizado ao ser libertado em 1945 e até uma opinião sua sobre Dutra e Eduardo Gomes é registrada. Embora em seu título seja feita referência ao período de 1937 a 1945, o filme de Escorel também se refere a acontecimentos posteriores e, portanto, fica aberto espaço para que uma das causas principais do que é visualmente recuperado merecesse mais atenção.
Uma das formas de documentário é esta que utiliza imagens do passado, conservadas por entidades e pessoas que sabem de sua importância. A História do Cinema registra vários trabalhos valiosos em tal setor. Escorel fez um trabalho minucioso, que merece toda a atenção. Mas o filme está longe de ser um 18 Brumário em imagens. Porém é impossível negar sua importância numa época em que outra das ditaduras sofridas pela República é bem mais lembrada. Escorel é mesmo bastante rigoroso na questão da tortura, não poupando a figura do chefe do regime. Mas o filme deveria ser mais enfático na focalização das contradições em vez de limitar-se, de forma correta, aliás, ao fato de o País sacrificar vidas na Europa, combatendo um regime que estava entre os modelos do Estado Novo. O mais importante, no entanto, está registrado: o sorriso de um ditador escondendo atrocidades, pompas patrióticas ocultando ações repressivas, palavras solenes acobertando a perseguição à arte e à divulgação de ideias.
 
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