Nem todos os negócios que 'saíram de moda' tiveram um fim

Como locadoras de vídeos, lan houses e lojas de revelação de fotos resistem no mercado


Nem todos os negócios que 'saíram de moda' tiveram um fim

A recente notícia de que a Espaço Vídeo, locadora tradicional do bairro Bom Fim, em Porto Alegre, vai fechar as portas deixou em evidência um fato: produtos e serviços inovadores derrubam até os negócios que um dia tiveram um público fiel. Nesse caso, os serviços de streaming - como Netflix - tomaram o lugar dos filmes em DVDs e Blu-ray locados para assistir em casa.
A recente notícia de que a Espaço Vídeo, locadora tradicional do bairro Bom Fim, em Porto Alegre, vai fechar as portas deixou em evidência um fato: produtos e serviços inovadores derrubam até os negócios que um dia tiveram um público fiel. Nesse caso, os serviços de streaming - como Netflix - tomaram o lugar dos filmes em DVDs e Blu-ray locados para assistir em casa.
Resistir à essa tendência não é fácil. Mas Jhonattan Queiroz, 30 anos, proprietário da Cinne Vício, é um exemplo de que é possível. O estabelecimento, localizado no bairro Santa Maria Goretti, na zona norte da Capital, é uma das poucas locadoras que ainda restam em Porto Alegre. Com um acervo de cerca de 20 mil filmes, o empreendedor, natural de Camaquã, conta que o entusiasmo de seguir no ramo veio da paixão pela sétima arte. "Sempre amei cinema e fico feliz de poder trabalhar com o que eu amo", conta. Há cerca de nove anos surgiu a oportunidade de compra da loja. O investimento, na época, foi de R$ 24 mil.
Jhonattan entrou no mercado quando ele já estava em crise. "Era o 'boom' da pirataria e as pessoas estavam migrando para outras plataformas, antes mesmo de surgir a Netflix e afins", lembra. A solução encontrada por ele para dar vazão aos títulos foi operar um e-commerce. Atualmente, as vendas pela internet representam 75% do faturamento - os aluguéis de filmes ficam com os outros 25%.
E não se trata de queima de estoque. Embora as vendas gerem grande parte do movimento, o empreendedor garante que o trabalho de reposição com lançamentos é constante. "Não sou uma locadora que está vendendo o acervo", pontua. "Não tenho planos de fechar a minha loja tão cedo".
O otimismo prevalece porque ele diz ainda haver público para locação. "São pessoas que buscam os clássicos, filmes europeus e filmes nacionais. São os que você não encontra no streaming", explica.
Jhonattan acredita que para se manter em um mercado em declínio é necessário se reinventar. Para tal, realiza anualmente o Bolão do Oscar Cinne Vício. "Muitas pessoas vêm assistir ao Oscar juntos e levam prêmios para casa." Além disso, gera conteúdos que conversam com o seu público para manter a presença digital. "É uma forma de ter as pessoas sempre ligadas à marca, o que é muito importante". O próximo passo é transformar o estabelecimento em um café temático de cinema, além de locadora e distribuidora.
CLAITON DORNELLES /JC

Ainda se leva vídeo para assistir em casa

Em funcionamento desde 1989, a E o vídeo levou é outra locadora que tenta se manter em Porto Alegre. Os proprietários Álvaro Bertani, 52 anos, arquiteto, e sua irmã, Edla Bertani, 56, publicitária, garantem que ainda há procura pelos serviços oferecidos pelo estabelecimento.
Localizado no bairro Jardim Botânico, o espaço, construído no final dos anos 1990, especialmente para o funcionamento da locadora, guarda cerca de 34 mil títulos, entre DVDs, blu-rays e VHS.
O negócio partiu do amor da dupla pelos clássicos do cinema bem quando a moda das locadoras fervilhava. O retorno foi tão positivo que o imóvel ficou pequeno para o acervo. Daí, veio a mudança para um espaço maior, onde operam hoje (rua Itaboraí, nº 550). Com um investimento inicial de mais de R$ 500 mil, a estrutura foi feita sob medida e de modo especial para abrigar as, até então, fitas VHS.
Embora a tecnologia traga desafios, a necessidade de adaptação não surgiu só agora. Neste período de funcionamento, o empreendimento já teve revistaria, mesa de pingue-pongue, videogame, fliperama, pista de autorama e, inclusive, uma biblioteca focada em cinema. Tudo para manter a clientela.
Desde 1993, a E o vídeo levou faz a entrega dos filmes por motoboys, aumentando o conforto do público. Além disso, possui um software e um site para controle sobre compras, locações, pesquisas e conteúdo.
Atualmente, a loja vende para o Brasil inteiro. Os longas em VHS ainda são procurados por colecionadores e por quem busca títulos específicos para trabalhos acadêmicos.
No acervo, há lançamentos, clássicos, populares, filmes apresentados no Fantaspoa e em outros festivais alternativos do mundo inteiro. A locação representa, atualmente, 60% do lucro total do empreendimento.
Sobre a dificuldade no cenário atual, Álvaro credita parte da culpa aos fornecedores. "Todo mundo acha que o problema é o cliente, mas não é. O problema são os fornecedores que estão fechando, e a gente acaba tendo pouca mercadoria. Os clientes diminuíram, mas ainda temos uma quantidade muito boa, o que falta é produto", esclarece o empreendedor.
CLAITON DORNELLES /JC
 

Lan houses agregam serviços para se manter atrativas

O acesso à internet se difundiu consideravelmente nos últimos anos. Hoje, com smartphones, o uso de computadores diminuiu, e, consequentemente, os serviços de aluguel de uso por minuto nas máquinas também.
Thiago Nogueira Machado, 34 anos, acompanha esse movimento diariamente. Ele é proprietário da Sigma Lan House e Eletrônicos, na avenida Bento Gonçalves, nº 2.249, no bairro Partenon, na Capital.
Para driblar a situação, ele agregou diferentes serviços ao negócio. O empreendedor passou a vender acessórios, softwares, jogos de videogame e consoles. Além de implantar serviços de impressão, xerox e digitação.
"Desde 2015, senti uma queda vertiginosa no faturamento por parte dos acessos", conta.
O serviço de acesso representa, hoje, apenas 20% do faturamento. Mesmo assim, Thiago considera que "ainda é uma parte importante do negócio".
E ele prova com uma constatação: "consigo pagar as contas da loja só com os acessos".
LUIZA PRADO/JC

Baixa de revelação de imagens dá lugar a fotoprodutos

Há poucos anos, na volta de uma viagem ou após uma festa de casamento, era comum sentar para ver álbuns de fotos. Com a tecnologia, o álbum físico tem se tornado cada vez mais raro e sendo substituído por plataformas digitais, como Facebook e Instagram. Nessa troca de hábito, o negócio de Sílvio Luiz Aires da Silva, 59 anos, e Hildegard Malgut, foi afetado. A dupla é proprietária da Kasaphoto Laboratório Fotográfico, que fica na rua 24 de Outubro, nº 1.391, no bairro Auxiliadora, em Porto Alegre.
O jeito, dizem, é prestar atenção nas tendências e modos de consumo do seu principal produto, a fotografia. Sílvio lembra que o negócio passou por dois momentos divisores de águas. Um foi em 2003, com o surgimento da fotografia digital. O segundo, em 2009, com o boom dos celulares com câmera.
Se adaptar a um laboratório digital de impressão não foi simples. O investimento chegou a US$ 300 mil. 
"Até aquele momento, tínhamos apenas equipamentos analógicos de revelação de filmes e impressão. Fomos o segundo laboratório digital de Porto Alegre", recorda Sílvio, com orgulho. 
Da lacuna deixada pelas impressões de filmes fotográficos, a empresa incorporou serviços de produção de fotoprodutos personalizados, como canecas, camisetas, almofadas e embalagens estampadas. Os sócios, ainda, aumentaram a presença na internet e viram que o consumidor virou mais autônomo. Por isso, investiram em um programa on-line em que os próprios clientes descarregam e selecionam as fotos e organizam a disposição delas. Nessa onda, na loja, há um totem eletrônico de autoatendimento para revelação de imagens digitais.
De 2015 para cá, no entanto, a Kasaphoto sentiu uma queda acentuada nos ganhos oriundos de revelações. "Antes, a impressão representava 80% do nosso faturamento". Hoje, representa 50%, empatando com a produção de livros fotográficos.
Ele atribui a queda ao smartphone, que massificou a captura de fotos e armazena os arquivos no próprio dispositivo. Em contrapartida, o empreendedor vê nisso uma outra oportunidade. "As pessoas estão vindo até aqui atrás de soluções para que os arquivos não se percam", explica.
Sílvio lamenta que, com a tendência do digital, há quem perca suas lembranças. "Tem muita gente que armazena (mídias) apenas no digital e está perdendo esses registros. Às vezes, são momentos como os dos filhos pequenos", exemplifica. 
E o empreendedor continua vendo potencial no ramo em que atua. A revelação de fotografias, para ele, está longe do fim.
"É uma coisa de que as pessoas estão se dando conta de que precisam fazer."
MARCO QUINTANA/JC