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Entrevista Especial

- Publicada em 18 de Março de 2018 às 21:57

Tamanho do Estado deve ser reduzido, diz presidente do IEE

'Hoje, o político decide tudo na nossa vida - até se pode ou não usar sal na mesa', pontua Lamb

'Hoje, o político decide tudo na nossa vida - até se pode ou não usar sal na mesa', pontua Lamb


CLAITON DORNELLES/JC
Defensor e estudioso de conceitos liberais, o presidente do Instituto de Estudos Empresariais (IEE), Júlio César Bratz Lamb, é a favor da privatização de empresas estatais e acredita que o ideal para o Brasil seria avançar até um Estado mínimo, que garanta apenas segurança, justiça e o funcionamento das instituições.
Defensor e estudioso de conceitos liberais, o presidente do Instituto de Estudos Empresariais (IEE), Júlio César Bratz Lamb, é a favor da privatização de empresas estatais e acredita que o ideal para o Brasil seria avançar até um Estado mínimo, que garanta apenas segurança, justiça e o funcionamento das instituições.
Lamb avalia como positiva, inclusive, a saída do poder público de áreas como saúde e educação, que seriam supridas pela iniciativa privada, sendo o Estado apenas o intermediador entre o recurso e o acesso ao serviço.
“É consenso entre os liberais que a segurança e a justiça têm que ser incumbências estatais”, explica. “Todo o restante, veríamos com absoluta convicção que não precisariam ser atividades estatais.”
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Lamb também fala sobre as mudanças na relação entre empregador e empregado, possibilitadas pela reforma trabalhista. Para ele, “talvez não devesse haver leis trabalhistas”, mas, da maneira como está hoje, vê como positiva, inclusive para os trabalhadores.
“Quanto mais emprego tiver, pior é a vida do empregador e melhor é a vida do funcionário, que pode escolher onde trabalhar. É isso que temos que buscar”, defende.
Jornal do Comércio – O que pode ser considerado, atualmente, um conceito de liberdade nos campos econômico e político?
Júlio Lamb – Os políticos sempre são, por natureza, identificadores de oportunidade. Eles sabem o que gera voto, começam a entender hoje que valores de liberdade angariam votos e, por isso, adequam seus discursos, gerando esse espectro político que cada um tenta se apropriar de uma fração dos conceitos de liberdade. Mas, quando começamos a desviar para outros campos, eles ou já resvalam, ou não concordam, de forma que entendemos claramente que não entendem o conceito e que o que estão fazendo é se apropriar de uma parte daqueles valores.
JC – E que valores são esses?
Lamb – São, em suma, o respeito máximo aos indivíduos e outorgar ao indivíduo que seja tomador de decisão de qualquer aspecto da sua vida. Isso vai imputar no campo social, ou seja, o que uma pessoa vai fazer da sua vida só é atribuição dela e de ninguém mais. Na pauta econômica, se ela quiser empreender, ser funcionária, ou se ela quiser negociar se vai ter 10 meses de férias ou dois meses, só vai imputar a ela. Na pauta política, é um desmantelamento do poder, em que o político deixe de se outorgar os processos decisórios da sociedade. O que acontece, hoje, é que o político decide tudo na nossa vida – até, por exemplo, se pode ou não usar sal na mesa. Toda a esteira social é decidida pelos políticos, e a gente diz que não quer que essa decisão seja do político, mas que seja na ponta, no indivíduo. Inclusive, respeitamos muito os princípios da subsidiariedade, que diz que, ao invés de decidirmos em um ente central – governo federal –, decidimos nos municípios. E o liberalismo é mais além ainda, ele diz que o princípio de subsidiariedade é tão importante para nós que não é o município, é o indivíduo. Ou seja, é abaixo do município quem vai tomar o poder de decisão. E a decisão vai ser em qualquer campo: econômico, político e social.
JC – E como é que isso se aplica na prática, se o sistema que temos hoje não tem esse perfil?
Lamb – Não, o sistema que a gente tem hoje é bem distante, mas o trabalho, talvez, infeliz ou felizmente, deve passar pela via política. O trabalho que temos que buscar é de um esvaziamento dos poderes público e político. Que, em algum momento – talvez, soe exagerado, mas garanto que não –, os políticos não se façam mais necessários. Isso não é utópico, isso é dizer a eles que a única coisa sobre a qual eles devem legislar é garantir que as instituições funcionem corretamente no País. Que o Executivo, o Legislativo e o Judiciário funcionem, que o Judiciário seja o aplicador de lei, que a polícia seja um aplicador da força, ou seja, garantam a instrumentação institucional do País. E, fora isso, que eles não decidam nada, que eles deixem as pessoas decidirem. Temos que buscar, de forma prática e pragmática, a eleição de pessoas que conheçam seus limites e se imputem como esvaziadores do poder político, e não como um demérito, mas reconhecendo as virtudes dos indivíduos que estão lá na ponta tomando decisão. Ou seja, que reconheçam a inépcia, por vezes, do poder político, e esvaziem o seu poder, fazendo realmente uma transferência de poder da vida política e pública para a vida da sociedade civil. Isso vai respeitar o princípio da subsidiariedade e vai respeitar, no fim, o cidadão que está lá na ponta vivendo nas cidades.
JC – Quem está na ponta, hoje, tem condições de viver em um modelo como esse no Brasil? De ser responsável pelos atos e tomar suas decisões sem o poder público como um intermediário?
Lamb – Tenho absoluta convicção de que ele tem. Normalmente, é colocado para nós o discurso de que não temos condições de tomarmos nossas próprias decisões, mas o político que vamos eleger é muito mais inteligente e vai tomar decisões melhores pela população. Olha que bom! Mas isso não é verdade. Também temos que romper a cultura no País de que o pobre é incapaz e burro. O pobre é tratado como um idiota no País. Mas tem uma estratégia por trás de ele ser tratado dessa forma, de que ele precisa de um político que tome decisões por ele. Então, tira-se o poder, esvazia aquele indivíduo e ele não consegue fazer nada. Ele vai ao trabalho com um ônibus ou uma locomoção qualquer horrível. Quem fornece? Ente público. Quando ele precisa ir a um hospital e quase morre na fila do SUS (Sistema Único de Saúde, quem fornece? Ente público. Dizem que esse cara é mal educado (formação) e que deveria receber melhor formação, mas quem fornece? Ente público. Ele trabalha e ganha um salário-mínimo que não o sustenta e 40% são impostos no Brasil, sem falar de Imposto de Renda, é imposto direto. Mas isso é ente público. Esse indivíduo é subtraído como pessoa pelo ente público em todas as suas esferas, e continuamos dizendo que ele é incapaz. Quem sabe a gente rompe o elo e torna as pessoas capazes, tentando deixar de ter um mediador ou salvador que vá surgir pela via pública e entender que as pessoas são capazes, são corretas, têm capacidade de tomar decisões e é assim que tem que ser. Enquanto não romper esse elo, automaticamente, vai ter um político outorgando-se o direito e o dever de cuidar dos outros, e continuaremos como estamos.
JC – Esse é um modelo muito tratado politicamente, que a prioridade do governo tem que ser saúde, segurança, educação, e o resto não. É a lógica desse pensamento?
Lamb – É muito próxima, e, dentro dos princípios liberais, têm distinções graduais, inclusive de mais ou menos liberais. Isso seria quase um princípio de um minimalismo de Estado, em que ele se outorgaria alguns poderes básicos de saúde, segurança e educação. Diria que é consenso entre os liberais que a segurança e a justiça têm que ser incumbências estatais, para ter isenção, de forma que ninguém que não seja legitimado para isso exerça força e faça justiça em um ente estatal. Todo o restante, veríamos com absoluta convicção que não precisariam ser atividades estatais. Os exemplos da saúde e da educação, acho que, em um primeiro momento, podem continuar, apesar de resultados nefastos – estamos formando mal nossos alunos e matando as pessoas nos corredores dos hospitais. Os caminhos alternativos são óbvios. As pessoas que não têm condições, que estudem em um colégio privado bancadas pelo ente público através de sistema de vouchers, como já tem no mundo inteiro. A saúde, a mesma coisa, não precisamos construir hospitais. Quem sabe a gente paga para quem não tem condição. Será que alguém não prefere ser assistido no (Hospital) Moinhos de Vento do que em qualquer hospital público?
JC – Nessa linha, qual é a sua avaliação sobre a pauta das privatizações – como o caso das que estão em curso no Rio Grande do Sul, das estatais do setor energético - CEEE, CRM e Sulgás -, e, no Brasil, com a tentativa de privatização da Eletrobras?
Lamb – Qualquer liberal que conheça os princípios vai defender ao máximo as privatizações. E não é pela defesa das privatizações em si, é pela ótica primária de que não deveríamos sequer ter empresas estatais fornecendo serviços que tranquilamente poderiam ser fornecidos pela iniciativa privada. O que vemos, hoje, no Brasil, são regimes de monopólios estatais, como, por exemplo, os Correios. Quem sabe, vende-se ou privatiza, e chamamos toda a iniciativa privada a suprir. E colocamos quantas empresas quiserem e tiver espaço a competirem. Qualquer agenda de privatização vai ser sempre bem-vinda, porque é tirar poder da agenda política, da troca de favores que vimos na Petrobras, no Banco do Brasil, na Caixa (Econômica Federal), e que está intimamente ligado (ao fato de) as empresas serem estatais. Não vemos corrupção em empresas privadas, e, se vemos, o prejuízo é dos proprietários, dos acionistas. É uma pauta iminentemente necessária para que o Brasil avance e se modernize.
JC – E quanto à reforma trabalhista, qual é a sua avaliação? Existe uma linha de alegação de que ela prejudica, além do trabalhador, o próprio empresário, pela insegurança jurídica que criou.
Lamb – A reforma trabalhista é até mais fácil de falar sob a ótica liberal. Vai ser muito frutífero para a população que cada indivíduo negocie diretamente. O que prejudica o trabalhador não é a lei trabalhista, é ele estar desempregado. Hoje, temos 14 milhões ou 15 milhões de desempregados no Brasil que talvez encontrassem regimes mais fáceis, que eles aceitariam, porque aquilo é uma boa opção para o momento em que estamos. Mas não apenas isso. No momento em que o mercado de trabalho se fortalece, quem ganha força é o trabalhador, não o empresário. É isso que temos que buscar, a negociação direta entre o trabalhador e o empregador.
JC – A empresa tem condições para isso? Em empresas grandes, quem seria essa pessoa?
Lamb – Qualquer empresa, independentemente do porte, tem hierarquias. Em uma multinacional, não tem como negociar com o presidente, mas tem como negociar com quem está contratando. A negociação já existe no ato da contratação. E aquele mesmo alguém que contratou vai ter que responder depois, ao longo da carreira dentro daquela empresa. Se as empresas não conseguirem fazer isso, vão perder os seus talentos. A força do trabalhador existe tão mais quanto mais forte for o mercado de trabalho, quanto mais ofertas tiverem. Quanto mais emprego tiver, pior é a vida do empregador e melhor é a vida do funcionário, que pode escolher onde trabalhar. É isso que temos que buscar.
JC – A reforma trabalhista poderia ter avançado em alguns pontos?
Lamb – Sem dúvida. E vou além, talvez não devesse haver leis trabalhistas. De forma que o próprio empregador e o próprio trabalhador negociem diretamente quais são as condições em que eles se sentem confortáveis.
JC – Isso não confronta com a ideia de que tem que ter um poder moderador para definir se o que está sendo praticado é adequado? Porque é a lei que dá subsídio para se fazer o balanço.
Lamb – Não confronta, justamente encontra eco, porque, no momento que o empregado combinou com o seu empregador, isso vai gerar um contrato, correto? Qual vai ser o papel do Judiciário? Averiguar se o contrato privado, firmado entre as partes, está sendo cumprido. E aí entrará o papel do Judiciário – outorgar e confirmar se o que foi combinado está sendo cumprido. Ele vai ter sobre o que deliberar. Não vai ser sobre a lei trabalhista, mas sobre o acordo entre as partes. E, ainda assim, vai encontrar vazão e necessidade de um sistema Judiciário muito maduro, que consiga entender as particularidades de cada acordo, cada um deles vai ser diferente do outro, vai escolher seus regimes de trabalho e ter maior liberdade de tomar suas decisões.

Perfil

Júlio César Bratz Lamb tem 29 anos e é natural de Porto Alegre. Ingressou, em 2011, no Instituto de Estudos Empresariais (IEE), onde, atualmente, é presidente - gestão 2017/2018. O IEE, entidade fundada em Porto Alegre em 1984, é responsável pela realização do Fórum da Liberdade, que, neste ano, chega à sua 31ª edição. Lamb se formou em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) em 2010. Desde então, trabalha na empresa da família - Lamb Construções e Engenharia -, ocupando, atualmente, o cargo de gerente. Na indústria da construção, teve atuação nas áreas de orçamentos, suprimentos, gestão de contratos e negócios, e gestão comercial. Além da formação na Ufrgs e da capacitação recebida por meio do IEE, Lamb tem pós-graduação em Gestão Estratégica e Econômica de Negócios pela Fundação Getulio Vargas (FGV). Participou de cursos sobre liderança no Brasil e no exterior, e de seminários de gestão.