Nos dias atuais, quando as coproduções se tornaram quase uma norma, fica cada vez mais difícil classificar um filme por sua nacionalidade, tão diversas são as fontes originárias de recursos e grande o número de artistas e técnicos de vários países envolvidos na realização. Talvez, já que cabe ao diretor, pelo menos no que se refere à construção final da imagem, as decisões definitivas, o melhor caminho para encontrar a nacionalidade de um filme seria destacar o nome de seu realizador. No caso de O filho uruguaio, apesar da revelação presente no título da obra, não seria um erro classificá-lo como filme francês, já que ele vem assinado por Olivier Peyon, que, a se julgar por este trabalho, não possui aquelas virtudes necessárias para sua inclusão entre o grupo dos que têm a capacidade de desenvolver um tema de forma a aproximá-lo de situações reveladoras, aquelas que transformam a realidade registrada em síntese necessária à compreensão de determinados acontecimentos. O filme, que tem locações em Montevidéu e Florida, é mais um a tratar do tema da reconstrução da família desfeita, mas basta apenas a citação de um filme recente, o russo Sem amor, que também trata da busca de uma criança, para que seja percebida a distância que existe entre um criador e um narrador. Peyon sabe contar uma história, mas parece ter esquecido que a família humana não está separada da realidade exterior, pois, além de fazer parte dela, é a sua origem.
Foi em 1985 que o diretor argentino Luiz Puenzo realizou A história oficial, no qual tal tema era desenvolvido de forma a transformar o drama vivido pela protagonista, uma professora que termina se deparando de forma dolorosa com a realidade de seu país, ao desconfiar que a criança por ela criada era filha de vítimas da ditadura. No caso de O filho uruguaio, tudo se concentra no universo familiar. Nada se relaciona ao mundo exterior. O drama vivido pela personagem vivida por Isabelle Carré tem origem na atitude do pai do menino que sequestrou o filho e o levou para o Uruguai, onde a criança cresce acreditando que a mãe francesa está morta. O empenho da protagonista em encontrar o filho se mescla a um drama ainda maior: recuperar um afeto que se encontra limitado a visitas ao cemitério, onde o menino orna com flores um túmulo simbólico. Um drama como este merecia muito mais do que Peyon oferece ao espectador. Ele, sem dúvida, deixa escapar inúmeras sugestões e prefere se expressar através de superficialidades, como aquele relacionamento entre o menino e o assistente social. A aproximação entre os dois, numa cena precariamente encenada e difícil de ser aceita, é bastante artificial e mesmo constrangedora. De um momento para outro, o estranho se torna íntimo das crianças e, a seguir, se apresentando como turista, ganha imediata simpatia da avó e da tia do garoto.
Certamente, um cineasta de imaginação superior saberia ver em certas cenas sugestões que, desenvolvidas com criatividade, dariam força ao filme. Uma dessas sugestões desperdiçadas é a do encontro no cemitério, o ressurgimento da mãe do mundo dos mortos, cena construída de forma a praticamente ignorar suas potencialidades. Mas seria injusto esquecer o veículo utilizado pelo assistente social em suas andanças pela cidade. O carro se move, mas seu aspecto e sua precariedade parecem simbolizar um mundo em crise e decadência, em busca de recuperação. No epílogo, o cineasta não consegue escapar da superficialidade. A figura materna é vista em todo o filme como uma personalidade agressiva e mesmo emocionalmente descontrolada. Assim, o toque de compreensão e humanismo que surge nas cenas finais é difícil de ser aceito. É algo, por sinal, que o menino parece perceber, através de um olhar e de uma atitude que evidenciam resistência diante da nova situação. O filme de Peyon é mais um a excluir das imagens aqueles elementos que o tornariam peça relevante e também essencial. Assim como está, é mais um limitado pelo desinteresse de olhar para o mundo e pela incapacidade de captar em cada indivíduo as dores e os ressentimentos causados pelas distorções e as impiedades.