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Teatro

- Publicada em 15 de Outubro de 2017 às 17:20

Uns vão e outros voltam

Com a morte da atriz e produtora teatral e cultural Ruth Escobar, ocorrida na semana passada, sinto-me profundamente tocado porque, certamente, o Brasil ficou culturalmente mais pobre. Não acompanhei toda a trajetória da atriz, nascida no bairro de Campanhã, cidade do Porto, em Portugal e que, muito jovem veio para o Brasil, com a mãe, fugindo da ditadura salazarista. Aqui, casou-se com o filósofo Carlos Henrique Escobar, que viria depois a escrever uma peça biográfica sobre Louis Althusser, chamada Matei minha mulher (1983). Foi ele quem levou Ruth de volta à Europa, onde ela estudou dramaturgia. Retornando ao Brasil, idealizou um ônibus que circulava pela cidade de São Paulo, constituindo o Teatro Popular Nacional, e depois, a partir de 1964, inaugurou um teatro que batizou com seu próprio nome, o Teatro Ruth Escobar, na Bela Vista. Nesta altura, já estava separada de Escobar e casada com o arquiteto Wladimir Pereira Cardoso, que se tornaria cenógrafo de alguns dos espetáculos mais importantes da produtora. Foi assim que a conheci: fui assistir a Cemitério dos automóveis, de Fernando Arrabal, sob a direção de Victor Garcia, num garajão da rua 13 de maio, transformado em espaço cênico. Aliás, o espaço existe até hoje e continua recebendo espetáculos teatrais.
Com a morte da atriz e produtora teatral e cultural Ruth Escobar, ocorrida na semana passada, sinto-me profundamente tocado porque, certamente, o Brasil ficou culturalmente mais pobre. Não acompanhei toda a trajetória da atriz, nascida no bairro de Campanhã, cidade do Porto, em Portugal e que, muito jovem veio para o Brasil, com a mãe, fugindo da ditadura salazarista. Aqui, casou-se com o filósofo Carlos Henrique Escobar, que viria depois a escrever uma peça biográfica sobre Louis Althusser, chamada Matei minha mulher (1983). Foi ele quem levou Ruth de volta à Europa, onde ela estudou dramaturgia. Retornando ao Brasil, idealizou um ônibus que circulava pela cidade de São Paulo, constituindo o Teatro Popular Nacional, e depois, a partir de 1964, inaugurou um teatro que batizou com seu próprio nome, o Teatro Ruth Escobar, na Bela Vista. Nesta altura, já estava separada de Escobar e casada com o arquiteto Wladimir Pereira Cardoso, que se tornaria cenógrafo de alguns dos espetáculos mais importantes da produtora. Foi assim que a conheci: fui assistir a Cemitério dos automóveis, de Fernando Arrabal, sob a direção de Victor Garcia, num garajão da rua 13 de maio, transformado em espaço cênico. Aliás, o espaço existe até hoje e continua recebendo espetáculos teatrais.
Logo depois, ela criou O balcão, de Jean Genet, com direção do mesmo Victor Garcia: não hesitou em desmontar internamente todo o espaço do Ruth Escobar, cerca de cinco andares de prédio, indo até as garagens subterrâneas, constituindo uma espécie de torre vazada, dentro da qual ocorria o espetáculo. A plateia espalhava-se verticalmente, rodeando este espaço, a ver, de cima ou de baixo ou até mesmo frente a frente, as cenas idealizadas pelo escritor maldito francês.
Ruth Escobar nunca parou. Valorizou diretores como Ademar Guerra e José Renato, trouxe grupos teatrais (literalmente) de todo o mundo para se apresentarem em São Paulo, em sucessivos festivais que promovia, parte dos quais cheguei a assistir. Inimiga figadal da ditadura, sobretudo depois do Ato Institucional de 1968, integrou-se ao MDB e tornou-se deputada estadual de São Paulo por dois mandatos. O mal de Alzheimer obrigou-a a se afastar dos palcos: morreu sob disputas entre os filhos e praticamente na miséria, porque, segundo se chegou a denunciar, nem plano de saúde ela possuía. Ruth Escobar foi, de qualquer modo, uma das figuras mais fantásticas que animou a paisagem cultural brasileiro. Agora, a voz de Ruth Escobar se cala, mas tenho certeza de que todos aqueles que, como eu, pudemos conhecê-la e acompanhá-la, não vamos esquecê-la. Ela será, sempre, um exemplo.
Mas veja, Ruth vai, outros voltam, como o ator Pedro Santos. Pedrinho, como o chamávamos, começou sua carreira a convite do diretor Luciano Alabarse, fazendo parte do grupo Descascando o abacaxi, que tinha sua sede no Teatro de Arena. A lata de lixo da história foi sua peça de estreia, baseada em livro de ensaio do crítico Roberto Schwarz, que depois se tornaria seu amigo. Pedro Santos também se tornou dramaturgo, criando o grupo Vende-se sonhos, que montou School's out, na continuidade das experiências do grupo carioca Asdrúbal trouxe o trombone e do sucesso de Bailei na curva. Foi o principal ator do filme Deu prá ti, anos 70, de Giba Assis Brasil e Nelson Nadotti, enveredando daí em diante para o cinema e mudando-se para São Paulo.
Pois Pedro Santos está de volta a Porto Alegre. A mesma vitalidade daqueles anos 1970, em que teatro era militância (tanto ele quanto Ruth Escobar acreditavam nisso), e volta a Porto Alegre com planos: quer criar um grupo de teatro, repartir sua eventual experiência com jovens, e neste sentido começa a reencontrar antigos companheiros e amigos. O leitor pode guardar: quem não o conheceu, vai conhecer. Quem já sabe quem ele é, vai reencontrá-lo. Guardadas as proporções, é assim: uns vão, outros voltam. A vitalidade cultural depende destas partidas e chegadas.
 
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