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- Publicada em 06 de Julho de 2017 às 22:43

O suspense na fronteira, por Tailor Diniz

Até pouco tempo atrás, dizia-se que o romance policial no Brasil não tinha tanta relevância. O policial se iniciou com Edgar Allan Poe, em 1841, com Assassinatos na rua Morgue, e seguiu firme e forte, no mundo todo, encantando leitores. No Brasil, a coisa começou em 1920, em obra coletiva de Coelho Neto, Afrânio Peixoto, Medeiros e Albuquerque, e Viriato Correa; e se desenvolveu bastante, até chegar a Rubem Fonseca, Luiz Alfredo Garcia-Roza, Marcos Rey, Flávio Moreira da Costa e Patricia Melo, entre outros.
Até pouco tempo atrás, dizia-se que o romance policial no Brasil não tinha tanta relevância. O policial se iniciou com Edgar Allan Poe, em 1841, com Assassinatos na rua Morgue, e seguiu firme e forte, no mundo todo, encantando leitores. No Brasil, a coisa começou em 1920, em obra coletiva de Coelho Neto, Afrânio Peixoto, Medeiros e Albuquerque, e Viriato Correa; e se desenvolveu bastante, até chegar a Rubem Fonseca, Luiz Alfredo Garcia-Roza, Marcos Rey, Flávio Moreira da Costa e Patricia Melo, entre outros.
Tailor Diniz, autor de 16 livros, entre os quais o premiado Transversais do tempo (Açorianos e Ages de 2007) e o romance A superfície da sombra (2012, Grua), adaptado para o cinema pelo diretor Paulo Nascimento em 2017 e que já teve pré-estreia no Chuí, mantém a tradição na área do romance policial, com várias obras.
Noite adentro (Grua, 175 páginas, R$ 36,00), obra lançada há poucos dias, é uma história com suspense, ritmo ágil, enredo envolvente e personagens bem construídos, narrada em linguagem que flui tranquila como água de rio. A narrativa se inicia com a chegada de Antônio Messias na fronteira do Brasil com o Uruguai para visitar o amigo que mora no país vizinho.
Inácio Armendía, o amigo uruguaio, que foi seu colega de faculdade e de militância nos badalados anos 1970, o recebe com a senha: "Eu-odeio-rock-in-rio!". Antônio namorou Valentina Torquato, que foi casada com Inácio. Antônio foge de alguma coisa misteriosa e, com Inácio, vai se envolver no mundo do crime, da bebida, das casas noturnas e das mulheres da fronteira. Entre parrilladas, muita bebida, mulheres, amores, traições e crimes, a narrativa revela o rumo veloz e descontrolado que tomou conta de 12 horas movimentadíssimas noite adentro.
Num romance, uma das coisas mais difíceis é o estabelecimento de um clima ficcional. Diniz mostra bem esse clima da fronteira, lugar que parece um país independente, bom para viver, com suas próprias leis, suas próprias regras e com aquela linha pouco nítida entre o sol do dia, a neblina da noite e a aura de sonho ou delírio.
O romance mostra bem o grande poder feminino, justamente num espaço que parece masculino ao extremo. As mulheres de Noite adentro lembram Tudinha, a imortal personagem de Simões Lopes Neto no clássico conto O Negro Bonifácio, que termina assim: "Estancieras ou peonas, é tudo a mesma cousa: tudo é bicho caborteiro... a mais santinha tem mais malícia que um sorro velho!".
Noite adentro junta-se a Em linha reta e a A superfície da sombra, que têm em comum o tema "fronteiras e sombras" e confirma, uma vez mais, Tailor Diniz no primeiro plano da literatura brasileira da atualidade.

lançamentos

  • Serafina Corrêa - Memórias da Linha 11 (228 páginas), edição de Fabiano Laércio Mazzotti e organização de Ademir Antonio Bacca, patrocínio da Lei de Incentivo à Cultura, Minc e Buffon, apoio da prefeitura de Serafina, com dezenas de fotos e textos de colaboradores, com passado e presente do vibrante município.
  • 101 Sonetos Centenários (Alcance, 120 páginas), seleção e organização de Areimor Neto, edição e apresentação de Rossyr Berny, traz obras de Areimor e poetas do porte de Bocage, Cruz e Souza, Olavo Bilac, Zeferino Brasil e dezenas de outros. Obra referencial, que nasce clássica.
  • De quanta terra precisa um homem (Via Leitura, 80 páginas, tradução e notas de Natália Petroff, posfácio de Denise Sales), de Lev Tolstói, clássico infantojuvenil do gênio russo, trata de terra, riqueza, ambição, orgulho e contradições humanas, em texto simples e maravilhoso.

Crônicas de Rubem Braga

Hoje, aquelas crônicas tipo assim literárias, líricas, de frases bem torneadas como pernas de belas mulheres, crônicas que falavam das pequenas grandes coisas do cotidiano ou da falta de assunto - e que às vezes eram as melhores -, praticamente não existem mais. Hoje, o cronista redige pequenos artigos de opinião em cima dos milhões de informações, fotos e opiniões das redes sociais. O cronista que ia para a rua, ouvia as pessoas e os sons diversos, sentia os odores e perfumes da rua, tateava múltiplas superfícies e degustava comida de botequim ou de restaurante, este cronista está em extinção, como o mico-leão dourado.
Rubem Braga - O poeta e outras crônicas de literatura e vida (Global Editora,102 páginas), com seleção e prefácio de Gustavo Henrique Tuna, escritor, doutor em História Social e mestre em História Cultural, traz 25 crônicas inéditas em livro daquele que muitos ainda consideram o maior cronista brasileiro. Braga deu status de literatura para o gênero crônica e seus textos, quer pelo conteúdo, quer pela forma, estão em muitos livros que passam tranquilamente pelo julgamento do tempo e dos leitores.
Neste simpático volume, Braga é muito bem-humorado, afetivo e generoso. São crônicas sobre escritores, intelectuais, poetas, contistas, críticos, filólogos, historiadores, jornalistas e outros profissionais da palavra. A que dá título à obra é sobre Carlos Drummond de Andrade. Trata do novo livro do escritor à época, da falta de água no seu prédio, o que o deprimia.
Braga escreveu um belo texto sobre Clarice Lispector, dizendo que "no quarto centenário do Rio, sentimos com orgulho e prazer que a ucrano-pernambucana Clarice é, na verdade, uma grande contista carioca, da boa e nobre linhagem de Machado de Assis".
Uma das mais belas crônicas do livro é sobre o grande e imenso brasileiro Monteiro Lobato. Disse Braga: "Lobato estava sempre acreditando em alguma coisa, e com veemência. Ele acreditava em Dona Benta, no Marquês de Rabicó, na Narizinho, em todo o seu povo encantado. Foi por isso que essa gente viveu e vive, e não deixará Lobato morrer: ficará aí contando as histórias dele. As histórias de um homem aventuroso, destemido, engraçado e bom".
Numa crônica de 1986, Rubem Braga celebra os 80 anos de Mario Quintana e, no caderno de imagens do livro, está a antológica foto de 1966, quando, aos 60 anos do poeta, estavam Vinicius de Moraes, Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Quintana e Paulo Mendes Campos num almoço na casa de Rubem Braga, que ficou atrás do fotógrafo dizendo para pegar "só poetas". "Vejam que o time era forte", disse Rubem. O time era fortíssimo, imbatível, como a Seleção Brasileira de 1970.
Na apresentação, escreve Gustavo Henrique Tuna: "Com este livro, o leitor poderá mergulhar numa espécie de baía do imenso mar de letras a circundar o cronista, uma experiência tão inebriante quanto a da paisagem que ele contemplava no Rio de Janeiro, do alto de sua cobertura da rua Barão da Torre".

a propósito...

Estas crônicas do nosso maior cronista, além do registro afetuoso e bem-humorado de pessoas fantásticas, são um convite para os atuais cronistas. Um convite para valorizar o bom humor, as pessoas, os sentidos, a rua, a natureza e a vida.
Crise política, econômica, ética e outras tantas crises invadem ou "ocupam" o espaço dos cronistas. As redes sociais, os milhões de fotos, palavras e sons atordoam a mente dos escribas e de todos, mas, ao fim e ao cabo, é preciso também e principalmente escrever sobre as pessoas, sobre a vida e sobre os passarinhos que acontecem, sem dar bola para essa cacaca produzida por esses elementos que teimam em não largar o osso.