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Sistema Carcerário

- Publicada em 12 de Janeiro de 2017 às 18:02

'Pessoas não foram feitas para serem segregadas', diz Valois

Para juiz, quanto menos pessoas na prisão, melhor

Para juiz, quanto menos pessoas na prisão, melhor


DIVULGAÇÃO/JC
Foi através de uma ligação do secretário de Segurança Pública do Estado do Amazonas que o juiz Luís Carlos Valois, da Vara de Execução Penal de Manaus, foi chamado para a negociação durante a rebelião no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj). Ele afirma não entender por que sua atuação naquele dia é tão questionada. "Minha participação não foi tão importante assim", comenta.
Foi através de uma ligação do secretário de Segurança Pública do Estado do Amazonas que o juiz Luís Carlos Valois, da Vara de Execução Penal de Manaus, foi chamado para a negociação durante a rebelião no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj). Ele afirma não entender por que sua atuação naquele dia é tão questionada. "Minha participação não foi tão importante assim", comenta.
Mesmo que pense assim, Valois entrou em contato direto com os presos, após longas horas de comunicação apenas por rádio. Para ele, no entanto, isso não salvou a vida de nenhum detendo. "Os presos que foram assassinados já estavam todos mortos. Se salvei a vida de alguém, foi de refém, porque havia dez quando eu cheguei", relembra. A partir daquele momento, algumas negociações foram feitas, entre elas, de que não haveria mais fuga para o semiaberto e que os detentos liberariam três reféns. O juiz comenta que as negociações serviram para que as autoridades decidissem sobre as reivindicações dos presos. Entre os pedidos, o desejo que a tropa de choque não entrasse no estabelecimento e que nenhum preso fosse transferido para a Penitenciária Federal. "Depois de um tempo, a polícia disse que teria que entrar, e expliquei a eles que não podia impedir as transferências, já que se tratava de um procedimento judicial", conta. Às quatro horas da manhã, os detentos cederam e, às sete, liberaram todos os reféns.
Quanto à privatização do presídio, Valois diz ter dúvidas sobre uma atuação terceirizada na segurança. Mesmo assim, acredita que os serviços sociais, médicos e educacionais podem ser administrados por empresas privadas. A administração híbrida pode até amenizar o sistema, mas, para ele, não sana as falhas já instauradas. "A prisão, desde que foi inventada, não é solução para nada. Prisão é só segregação, e pessoas não foram feitas para serem segregadas. Existem prisões piores que outras, mas prisão boa não existe", ressalta. Sobre um modelo ideal, o juiz é claro: "quanto menos pessoas na prisão, melhor."
Depois da ocorrência em Manaus, o juiz passou a questionar sua atuação. Sobre manter-se no cargo na Vara de Execução Penal, ele ainda tem dúvidas. "Estou repensando se vou continuar nessa Vara. Penso talvez na vaga para a Vara da Infância e da Juventude, quem sabe."

O modelo privado que funciona: o caso da Apac

Mencionado por especialistas como o melhor modelo, a metodologia de ressocialização promovida pela Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac) segue à risca o que sugere a Lei de Execução Penal. O detento é chamado de "recuperando" e trabalha, estuda e se qualifica para que saia, de fato, recuperado do sistema prisional. Atualmente, existem cerca de 45 unidades no Brasil - a maioria fica em Minas Gerais e no Paraná. A primeira foi instalada em 1972, em São Paulo.
Em 2015, a associação tomou posse de um terreno no bairro Guajuviras, em Canoas, na Região Metropolitana de Porto Alegre, onde pretende construir a primeira Apac do Rio Grande do Sul. Segundo o membro da diretoria da unidade de Canoas Mauro Mello, a iniciativa aguarda liberação de licenciamento ambiental. Além disso, o projeto arquitetônico está sendo avaliado. "Tínhamos o apoio da antiga gestão de Canoas e esperamos ter do novo prefeito. Também nos reunimos com o secretário estadual de Segurança, Cezar Schirmer, e estamos aguardando a aprovação", conta.
Além de trabalhar e de estudar, existe um cuidado para que o apenado seja tratado de forma humana. Além disso, não é qualquer detento que entra no sistema. "Só consegue uma vaga quem realmente quer melhorar. Se errar dentro da Apac, volta para o sistema comum", explica Mello. O resultado é um índice de reincidência de 15%, contra 85% dos egressos do sistema comum.
A Apac é uma empresa privada que, como qualquer outra associação, recebe investimento público. "Temos parcerias com empresas privadas também. Elas investem, promovem emprego para que o recuperando possa trabalhar", explica. No Rio Grande do Sul, a Apac Canoas conta com apoio dos Três Poderes. Inicialmente, o investimento previsto para a unidade gira em torno de R$ 5 milhões, mas, somente depois que o projeto arquitetônico for aprovado, será possível estimar um valor exato. Em Canoas, serão 66 vagas e, baseando-se em unidades já existentes, o custo de um recuperando é de R$ 990,00. O custo mensal de manutenção é de aproximadamente R$ 40 mil.
A defensora pública do Estado Cíntia Luzzatto, que atua como subdirigente do Núcleo de Defesa em Execução Penal, também aponta a Apac como o modelo ideal de ressocialização. "Precisam do engajamento de toda a sociedade civil, daquela parte que não quer ver o preso atrás das grades e esquecer que ele existe. As Apacs aplicam uma metodologia que rompe com o sistema penal vigente, porque prepara o condenado para ser devolvido à sociedade", explica.