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Saúde

- Publicada em 14 de Dezembro de 2016 às 19:11

Hospitais filantrópicos sofrem sem previsão de repasses estaduais

Estado deve R$ 6 milhões à Santa Casa de Misericórdia de Rio Grande

Estado deve R$ 6 milhões à Santa Casa de Misericórdia de Rio Grande


DEIVISON ÁVILA/ESPECIAL/JC
Mais uma vez, a mudança de ano não traz alento aos hospitais filantrópicos. A saúde no Estado, de modo geral, está na UTI, e se a tendência não é de piora, é de uma estabilidade negativa. Em Porto Alegre, pacientes se amontoam em emergências superlotadas, nas quais a espera por atendimento pode chegar a seis horas. No Interior, hospitais são fechados, leitos são reduzidos e profissionais, demitidos. O cenário que preocupou as entidades hospitalares no ano passado deve seguir tirando o sono em 2017.
Mais uma vez, a mudança de ano não traz alento aos hospitais filantrópicos. A saúde no Estado, de modo geral, está na UTI, e se a tendência não é de piora, é de uma estabilidade negativa. Em Porto Alegre, pacientes se amontoam em emergências superlotadas, nas quais a espera por atendimento pode chegar a seis horas. No Interior, hospitais são fechados, leitos são reduzidos e profissionais, demitidos. O cenário que preocupou as entidades hospitalares no ano passado deve seguir tirando o sono em 2017.
A Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes, Religiosos e Filantrópicos do Rio Grande do Sul realizou, em dezembro, uma pesquisa junto aos 245 hospitais filantrópicos do Estado. Entre janeiro e novembro, houve redução de 12,2% no número de leitos, enxugamento de 41,46% do quadro funcional (o que representa 4 mil demissões), redução de 20,73% das internações e de 19,51% dos atendimentos ambulatoriais. Os filantrópicos representam mais de 75% dos leitos do Estado. "A recuperação passa fundamentalmente pelo equilíbrio econômico", comenta o presidente da federação, André Emílio Lagemann.
As dificuldades econômicas são causadas, principalmente, pelo atraso dos repasses estaduais. A dívida já chega aos R$ 144 milhões, referente aos 17 programas implementados nos últimos anos. "O repasse mensal é de cerca de R$ 36 milhões. Fevereiro, março, abril e maio deste ano estavam atrasados, e o Estado conseguiu quitar fevereiro, mas deixou de pagar outubro", relata Lagemann.
Para 2017, o presidente espera que o governo consiga estabilizar as contas e que forneça um cronograma de pagamento. "Ainda não terminamos o ano. Há uma angústia a respeito do que será pago em dezembro e esse é um momento crítico, precisamos pagar o 13º salário dos funcionários." Ainda de acordo com o levantamento da federação, 23% das instituições hospitalares não conseguiram pagar a primeira parcela do 13º salário e 57% não têm previsão de como pagarão a segunda.
Mesmo assim, os atendimentos, ainda que reduzidos, não são interrompidos. Enquanto o governo de José Ivo Sartori atrasa os pagamentos, os hospitais recorrem aos bancos - o montante devido aos estabelecimentos financeiros pelos filantrópicos chega a R$ 1,6 bilhão. Por enquanto, não há previsão de como as dívidas do Estado afetarão a estrutura hospitalar em 2017. Segundo a federação, a diretoria tentará retomar contato com a Secretaria Estadual da Saúde (SES) para estabelecer um cronograma de pagamentos e, a partir daí, organizar a previsão para o próximo ano.
Quem também arca com as despesas hospitalares são os municípios. A Federação das Associações dos Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) calcula que a dívida do Estado para com as prefeituras, somente na área da saúde, chegue a mais de
R$ 320 milhões. "As prefeituras estão sobrecarregadas, gastando uma média de 23% do orçamento com saúde. Algumas investem até 34%, tendo de desassistir outras áreas para dar continuidade ao atendimento", comenta o assessor técnico da área de saúde da Famurs, Paulo Azeredo.
Programas como o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e o Estratégia Saúde da Família (ESF) já sofrem atrasos de R$ 7 milhões e R$ 6 milhões, respectivamente. O déficit com a Farmácia Básica chega a R$ 17 milhões. Tais dívidas acabam contribuindo para superlotar as emergências. "Falta medicamento nos postos, então as pessoas adoecem, procuram a emergência e os hospitais precisam suprir a necessidade de atenção básica", explica.
O governo federal também não tem repassado os valores mensais em dia. "Chegam a atrasar 30 dias. Isso desestabiliza a contabilidade do município. A situação já está difícil de suportar", lamenta Azeredo. Ele prevê que, se não houver mudança no cenário, as prefeituras deixem de assistir os hospitais, dedicando-se a manter apenas a atenção básica, cuja obrigatoriedade está prevista na Constituição Federal.

SES não apresenta previsões para 2017

Com orçamento estadual para 2017 já sancionado, a área da saúde receberá R$ 3,8 bilhões. Em 2015, a saúde recebeu R$ 2 bilhões. Procurada pelo Jornal do Comércio, a Secretaria Estadual da Saúde (SES) não respondeu às solicitações de entrevista com o secretário João Gabbardo dos Reis, alegando que precisava da previsão orçamentária para 2017 (que já tinha sido sancionada no momento do contato) e, posteriormente, que não tinha acesso à agenda do secretário. Em uma última tentativa, a SES, por meio da assessoria de imprensa, justificou que, "por questão de posicionamento, não é possível dar perspectivas para 2017".
No mesmo ano em que Gabbardo assumiu a pasta, em 2015, também foi anunciada a suspensão do pagamento do Incentivo de Cofinanciamento da Assistência Hospitalar (Ihosp). "Em dois anos, significa quase R$ 600 milhões a menos. Aí acontece isso, temos de reduzir a estrutura. O Sistema Único de Saúde (SUS) é o sustento de quase 80% dos hospitais, por isso, precisam desse repasse estadual", comenta o presidente da Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes, Religiosos e Filantrópicos do Rio Grande do Sul, André Lagemann.
A crise também afetou a saúde suplementar. Houve redução no número de detentores de planos de saúde privados e, assim, os pacientes migraram para o SUS, algo que também preocupa os hospitais. As instituições que dependem da sistema público enfrentam dificuldade de subfinanciamento principalmente devido ao contingenciamento federal e estadual. "O orçamento tem reduzido ano a ano e isso nos causa preocupação. O ano de 2017, em termos econômicos, tem sido percebido como mais um ano de dificuldade", comenta o vice-presidente do Sindicato dos Hospitais e Clínicas de Porto Alegre, Ricardo Minotto.
Para ele, uma das maneiras de aliviar a superlotação das emergências é investir na prevenção e na otimização dos recursos. "Cerca de 75% da população usa o SUS, então, é natural que as emergências estejam lotadas. Mas o SUS tem uma rede básica que pode ser acessada antes da emergência. Temos de estimular que a população busque o posto próximo de casa, de forma preventiva e continuada."

Situação preocupa em todas as regiões do Estado

  • Ainda não recebemos os valores de março, abril, maio e outubro referentes aos programas de emergência, UTI e gestante de alto risco, quase R$ 480 mil por mês. Ou seja, o Estado deve R$ 1,9 milhão ao Hospital Pompéia. Estamos em dezembro e sequer se fala no pagamento de novembro. Temos de honrar o compromisso do 13º salário e, para isso, teremos de buscar uma complementação bancária. Felizmente, não precisamos reduzir o atendimento, mas discutimos a necessidade de que seja criado um outro hospital referência em traumatologia e ortopedia, porque as filas de espera para essas especialidades são longas. O Pompéia tem 290 leitos, 1.320 funcionários e abrange 1,2 milhão de habitantes de toda a região serrana. Francisco Ferrer, superintendente do Hospital Nossa Senhora de Pompéia, de Caxias do Sul
  • Nossos servidores fizeram uma greve devido à falta de repasse dos salários. Estamos atrasando há três meses. O diálogo com o governo é bastante complicado, porque eles cobram produção, mas não repassam o Incentivo de Cofinanciamento da Assistência Hospitalar e atrasam os valores mensais. Assim, os fornecedores e os prestadores de serviços não querem se comprometer, uma vez que não há garantia de pagamento. Tivemos de reduzir em cerca de 15% o quadro de 700 funcionários, e os pedidos de demissão aumentaram em dezembro. Temos 240 leitos e também reduzimos cerca de 15%. Não há como pagarmos o 13º salário, nem previsão de quando esse problema será sanado. O atendimento do hospital, que abrange 2 milhões de habitantes, está 96% vinculado ao SUS - portanto, 80% do orçamento depende do repasse estadual. Giovane Cravo, administrador da Santa Casa de Caridade de Uruguaiana
  • Nossos funcionários entraram em greve, assim como nossa equipe de residência médica. O Estado nos deve mais de R$ 6 milhões. Além disso, passamos o ano inteiro sem uma lógica, sem um cronograma de pagamentos, e, assim, fica difícil organizar o hospital e pactuar com os prestadores de serviço. Essas paralisações são por falta de pagamento de salários - os vencimentos de novembro não foram pagos, bem como o 13º salário. Nossa maior prestação de serviços é para o Sistema Único de Saúde. Se o Estado não paga, não consigo manter o funcionamento. A Santa Casa de Rio Grande tem 400 leitos e o número de internações diárias reduziu drasticamente - hoje, são cinco por dia. Temos medicamentos, temos materiais, o que não temos é capacidade de atendimento. E o que assusta é que, se o governo continuar assim, e a perspectiva parece que é essa, vai começar a faltar material, tudo que é necessário em um hospital, e não só no nosso, mas em todos. Em 2016, a prefeitura, o Estado e o Ministério Público resolveram intervir no hospital, com a promessa de que seria entregue um cronograma de pagamentos, algo que não foi cumprido. O ano passado já foi um caos, mas conseguimos recuperar e, agora, no final do ano, agrava-se a crise, porque o Estado está segurando mais do que segurou no ano todo. Jeferson Alonso dos Santos, superintendente da Santa Casa de Misericórdia de Rio Grande