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Construção da paz

- Publicada em 20 de Outubro de 2016 às 12:49

Ampliação da Justiça Restaurativa busca mudar paradigmas

Brancher quer replicar modelo em locais como Susepe, Fase e escolas

Brancher quer replicar modelo em locais como Susepe, Fase e escolas


JONATHAN HECKLER/JC
Pouco comum no Brasil, a Justiça Restaurativa tem ganhado espaço no País nos últimos anos. O método consiste na superação de conflitos a partir da responsabilização dos autores para a reparação do dano, a partir de consenso estabelecido em círculos onde a vítima é a figura principal. No Rio Grande do Sul, diferentes entidades estaduais assinaram no dia 13 de outubro um protocolo para buscar a pacificação social no Estado através dessa ferramenta. O acordo é fruto da luta de juízes gaúchos que desde 2005 criaram o projeto Justiça para o Século 21, de divulgação e aplicação de práticas da Justiça Restaurativa. A proposta é mudar os paradigmas existentes em relação ao papel da Justiça quando um crime ou um conflito ocorrem.
Pouco comum no Brasil, a Justiça Restaurativa tem ganhado espaço no País nos últimos anos. O método consiste na superação de conflitos a partir da responsabilização dos autores para a reparação do dano, a partir de consenso estabelecido em círculos onde a vítima é a figura principal. No Rio Grande do Sul, diferentes entidades estaduais assinaram no dia 13 de outubro um protocolo para buscar a pacificação social no Estado através dessa ferramenta. O acordo é fruto da luta de juízes gaúchos que desde 2005 criaram o projeto Justiça para o Século 21, de divulgação e aplicação de práticas da Justiça Restaurativa. A proposta é mudar os paradigmas existentes em relação ao papel da Justiça quando um crime ou um conflito ocorrem.
Precursor no uso do método, o juiz Leoberto Brancher do Juizado Regional da Infância e Juventude de Caxias do Sul defende que a Justiça Restaurativa acelera o processo de capacitação social, tanto na prevenção quanto na resposta a crimes e conflitos. Em Porto Alegre, em 280 casos nos quais a ferramenta foi utilizada entre 2005 e 2007, houve redução de 23,5% na reincidência dos réus. A média mundial, segundo o magistrado, é de diminuição de 25%. Por isso, o Poder Judiciário tem implantado unidades de referência da ferramenta pelo Rio Grande do Sul. Nas unidades, são oferecidos programas de formação de equipe para resoluções restaurativas nas Varas de Infância e Juventude, Violência Doméstica, Execuções Criminais e nos Juizados Especiais Criminais.
Os programas de formação têm 25 vagas, sendo 15 para profissionais de dentro das varas e dez para juízes, promotores, defensores públicos, advogados e gestores das áreas de educação, assistência social, saúde e segurança convidados. "Essas pessoas têm o papel de levar o projeto adiante, abrir espaço para que seus subordinados possam evoluir", explica Brancher. A metodologia utilizada é a dos Círculos de Justiça Restaurativa e de Construção de Paz, que estabelece processos de diálogo que permitem a identificação e a compreensão das causas e necessidades subjacentes ao conflito, buscando a transformação para uma atmosfera de segurança e respeito.
As formações já ocorrem desde 2015, mesmo antes de o protocolo ser assinado. Durante as aulas, o foco é que o aluno entenda a lógica da Justiça Restaurativa e a repasse para a sua instituição, que pertence à rede de atendimento. No Juizado da Infância e Juventude, por exemplo, a participação de representantes do Conselho Tutelar, da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase), dos Centros de Referência Especializados em Assistência Social (Creas), de escolas, da Guarda Municipal e da Brigada Militar é importante. Nas Varas de Execução Criminal, torna-se necessária a formação de agentes da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe), entidades religiosas, conselhos comunitários, e assim por diante.
Com o protocolo assinado entre as entidades, os participantes dos cursos terão maior respaldo para replicar as práticas da Justiça Restaurativa, tendo garantida, inclusive, carga horária para fazer a formação. "Queremos alargar essas práticas. Pretendemos que a Susepe e a Fase, por exemplo, tenham programas do tipo junto aos seus internos, bem como Guardas Municipais e escolas municipais", cita o juiz.

Brigada Militar é única instituição da rede sem as práticas

Entre as instituições pertencentes às redes relativas a infância e juventude, violência contra a mulher, execuções criminais e Juizados Especiais Criminais, somente a Brigada Militar não possui nenhum tipo de prática restaurativa. A Polícia Civil tem o programa Mediar RS, a Fase conta com uma coordenadoria específica nesse sentido, a Secretaria Estadual de Educação trabalha a questão junto às Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e Violência Escolar (Cipaves), o Ministério Público atende a uma iniciativa comunitária no bairro Restinga, e a Susepe e a Secretaria Estadual de Saúde (SES) também têm instâncias de mediação de conflitos. "Então, na verdade, não vamos inventar nada: vamos reformar a rede através de uma iniciativa conjunta, fortalecendo-a de forma unificada e criando novas iniciativas", resume o magistrado.
Há exemplos em nível municipal de políticas públicas restaurativas. Um dos municípios com programas do tipo é Caxias do Sul, onde há o programa Caxias da Paz. As ações se dão em diversas áreas, como a integração de moradores em condomínios populares construídos pelo programa Minha Casa Minha Vida. "É uma experiência com iniciativas muito positivas. O programa existe desde 2012, criado durante a gestão de José Ivo Sartori como prefeito da cidade. Acredito que isso também facilitou a realização desse protocolo em nível estadual", pontua o juiz. Mesmo assim, ele salienta que o protocolo foi um movimento "de baixo para cima".

Ferramenta auxilia em situações extremas e previne conflitos

As práticas restaurativas estruturam possibilidades de conversar tanto para resolver situações extremas quanto quando não há conflito, mas se quer aproximar pessoas. "Uma turma de colégio pode se reunir, bater um papo orientado com início, meio e fim, e isso vai gerar mais vínculo, integrar aqueles alunos", exemplifica Brancher.
Em casos criminais, apesar de a Justiça Restaurativa normalmente colocar vítima e réu frente a frente, é possível aplicar o modelo sem a presença da vítima, caso ela não queira participar. "Podemos fazer isso com maridos ou companheiros de mulheres agredidas, por exemplo. O que trazemos é a metodologia", esclarece. Hoje, há 22 juízes trabalhando com Justiça Restaurativa no Rio Grande do Sul.
No dia 4 de outubro, ocorreu audiência pública na Comissão Especial do Código de Processo Penal da Câmara de Deputados sobre Justiça Restaurativa. Brancher apresentou um esboço de legislação para que a Justiça Restaurativa conste no novo Código de Processo Penal (CPP), debatido desde o início do ano no Parlamento nacional. A proposta é privilegiar soluções restaurativas em todo o Brasil. Haverá outras reuniões com a mesma temática nos próximos encontros da comissão.
A Justiça Restaurativa também foi pautada pela Resolução nº 225/2016 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que dispõe sobre a Política Nacional de Justiça Restaurativa no Poder Judiciário. A norma foi criada após recomendação da Organização das Nações Unidas (ONU) de que seus Estados-membros implantassem a ferramenta.