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desenvolvimento

- Publicada em 03 de Outubro de 2016 às 12:59

Brasil amarga a baixa competitividade

Cenário econômico faz com que empresas nacionais vejam suas margens serem corroídas

Cenário econômico faz com que empresas nacionais vejam suas margens serem corroídas


STOCKVAULT/DIVULGAÇÃO/JC
Performance econômica, eficiência governamental, gestão e infraestrutura são quatro aspectos que moldam o desenvolvimento de uma nação, mas que em tempos de crise estão em declínio no Brasil. A macroeconomia sofre com inflação e juros elevados, as contas públicas penam com a arrecadação inferior às demandas, os investimentos estão relegados e gerenciar esse cenário, equalizando questões sociais e políticas difusas, fazem com que o País estacione e fique para trás na competição com outros players mundiais.
Performance econômica, eficiência governamental, gestão e infraestrutura são quatro aspectos que moldam o desenvolvimento de uma nação, mas que em tempos de crise estão em declínio no Brasil. A macroeconomia sofre com inflação e juros elevados, as contas públicas penam com a arrecadação inferior às demandas, os investimentos estão relegados e gerenciar esse cenário, equalizando questões sociais e políticas difusas, fazem com que o País estacione e fique para trás na competição com outros players mundiais.
E, se o cenário nacional não ajuda, as empresas locais também perdem capacidade competitiva. É o que demonstra um levantamento feito pela reportagem do Jornal do Comércio, que avaliou a evolução das margens líquidas das empresas de capital aberto que compõem o Índice Bovespa (Ibovespa).
Os setores mais impactados, conforme mostra a tabela, foram os de bens industriais e de petróleo, gás e biocombustíveis. As retrações nessas áreas confirmam que a indústria brasileira está perdendo espaço em meio a uma nova revolução industrial, a da digitalização, denominada Indústria 4.0 (ou Smart Industry).
A pesquisa calculou os resultados dos primeiros semestres de 2011 a 2016, identificando que, em média, as margens caíram de 16,71% para 13,68% - o pior resultado geral foi o do primeiro semestre de 2015, em que as margens líquidas atingiram 9,78% .
Considerado um dos maiores traders do País, Alexandre Wolwacz - mais conhecido nos fóruns on-line como Stormer - revela que a margem líquida é um dos indicadores mais confiáveis para avaliar a saúde financeira das empresas. O percentual é calculado pelo lucro líquido divido pela receita líquida. Esse indicador demonstra se a receita está revertendo lucro. Ou seja, qual será o lucro para cada R$ 1,00 obtido com as vendas da empresa.
Com uma realidade diferente para cada um dos setores avaliados, as companhias que fazem parte do Ibovespa comprovam a tendência apontada pelo analista, de que as margens caíram como consequência da perda de competitividade do Brasil no período recente. Neste ano, o País alcançou a pior posição no Relatório Global de Competitividade, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial (com parceria da Fundação Dom Cabral).
No ranking, que avalia a capacidade competitiva de 138 países, o Brasil está em 81º lugar, muito atrás dos demais integrantes do Brics - China aparece em 28º lugar, seguida de Índia (39º), Rússia (43º) e África do Sul (47º). Integrantes do G-20 e nações em estágio de desenvolvimento inferior ao do Brasil, também passaram à frente, como Ruanda, em 52º lugar.
"O relatório combina dados estatísticos de 2015 com uma pesquisa de opinião abrangente com executivos de todo o País", explica Carlos Arruda, professor da Fundação Dom Cabral e coordenador da pesquisa no Brasil. Os pontos alcançados são transformados em índices para que, posteriormente, seja feita a comparação com os demais países.
São analisados 12 pilares de competitividade, divididos em três áreas: requerimentos básicos, potencializadores de eficiência e inovação e sofisticação. Os pontos em que o País mais regrediu foram inovação (com queda da posição 84 para 100), sofisticação dos negócios (de 56 para 63) e desenvolvimento do mercado financeiro (de 58 para 93).
A decisão de investir, empreender e lançar um produto novo no mercado é tomada combinando com análises de mercado e econômicas, além de um componente subjetivo que é a percepção do tomador da decisão. E se ele se retrai, a economia encolhe junto, puxando para baixo a competitividade do País.

Indicadores de eficiência e rentabilidade apontam declínio das operações

Cenário econômico faz com que empresas nacionais vejam suas margens serem corroídas

Cenário econômico faz com que empresas nacionais vejam suas margens serem corroídas


STOCKVAULT/DIVULGAÇÃO/JC
Análises mais complexas sobre a realidade das companhias brasileiras indicam que o impacto do atual contexto econômico é ainda mais severo quando analisado o todo das empresas listadas na BM&FBovespa. Segundo análises feitas pelo Instituto Assaf, 2015 foi um ano de resultados extremamente difíceis para as companhias de capital aberto.
O levantamento feito em relação ao ano passado, desconsiderando a atuação das empresas financeiras, verificou dados de 227 companhias. No total, foram reportados prejuízos líquidos consolidados equivalentes a R$ 24 bilhões, para um total de vendas de R$ 2,36 trilhões. A margem líquida, na média, foi de -1% contra 4,8% em 2014.
Para Alexandre Assaf Neto, pesquisador do Instituto Assaf, no melhor dos cenários, 2016 deve repetir o desempenho do ano passado. "O que eu vejo nas empresas é uma baixa capacidade de competitividade."
Na média, as empresas utilizam seus ativos (equipamentos) por 17 anos, sinaliza. Usar a mesma tecnologia por mais de uma década e meia coloca o País muito atrás dos que obtêm agregação tecnológica mais constante.
Outro aspecto que prejudica o desempenho das companhias é o baixo índice de crédito disponível. "Se pegar o balanço dos bancos, 35% dos ativos são crédito, quer dizer 65% estão com títulos do governo."
Para Assaf Neto, as condições macroeconômicas, sobretudo de juros elevados, inibem o investimento em ações, que tem se mostrado menos lucrativo do que nos títulos públicos, por exemplo.
Ao estimular o investidor a alocar recursos em títulos e não em ações de companhias inibe-se também o desenvolvimento das empresas, na produtividade. "Investimento em ações é o que gera riqueza", reforça. Outra crítica do pesquisador é que grande parte das empresas se viabilizou pelo subsídio do crédito, via Bndes, e não pela qualificação dos ativos e investimentos. Complementa o cenário uma legislação fiscal e trabalhista desafiadora para as empresas. "O processo está amarrado por todos os lados e a eficiência é penalizada."
Para o trader Alexandre Wolwacz, o que pesou mais na competitividade brasileira no último ano foi a política fiscal e uma performance econômica fraca. O analista acrescenta que a economia mundial está ficando mais eficiente, com menores custos de produção. "Nós não temos mais do que quatro ou cinco empresas de produto tecnológico competitivo", reflete, colocando a Embraer como um dos melhores exemplos nesse sentido.
Em termos competitivos, as companhias americanas e asiáticas, mais alinhadas ao desenvolvimento tecnológico, é que saem na frente. "A Europa está há 10 anos sem produzir empresas bilionárias", demonstra Wolwacz.
Ainda assim, o analista lembra que o Brasil é um gigante, com um enorme mercado consumidor, que é o motor para fazer com que a economia evolua largamente. Corrigir todos os outros itens dessa grande engrenagem é que o desafio para os próximos anos.

País vive cenário de retrocesso para o ambiente de negócios

Na análise sobre a capacidade competitiva dos países, os dados estatísticos costumam ser mais pessimistas do que a percepção dos participantes nos países emergentes. Porém, essa característica não apareceu no Relatório Global de Competitividade 2016-17, demonstra o professor Carlos Arruda, da Fundação Dom Cabral. Isso porque a coleta das opiniões foi feita de março a maio de 2016, um período crítico para a opinião pública em que a instabilidade econômica e política estava no auge, sobretudo, por conta do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Há três fases pelas quais os países tradicionalmente passam na evolução competitiva. A primeira delas é quando as nações menos desenvolvidas se voltam para o básico, como alcançar um nível educacional bom, estabelecer um marco regulatório compatível e possuir infraestrutura básica. Entre os países mais ricos, o objetivo é atingir excelência empresarial e inovação. No meio termo está o alcance da eficiência, que é o fazer bem-feito.
"O Brasil vinha, historicamente, registrando deficiência no básico, o que é um atraso, porque já deveria ter superado questões como qualidade da infraestrutura básica, marco regulatório adequado (e não defasado como o atual) e maior eficiência de governo (com mais transparência e menos corrupção). Para um país com o tamanho e a importância do Brasil, esses aspectos não deveriam ser o foco neste momento", avalia Arruda. O País possui características que destoam dos demais: embora tenha que superar deficiências estruturais, ainda consegue avançar, minimamente, em inovação. E foi justamente nesse aspecto que o Brasil mais regrediu no último estudo.
O caso brasileiro é "atípico", revela o pesquisado. "O Brasil é ruim no básico e melhor do que deveria ser no avançado, que é absorção de novas tecnologias. Este ano, perdeu capacidade de ter excelência empresarial e inovação. Esse talvez seja o fator que mais jogou o Brasil para baixo, porque o que compensava o básico fraco era a inovação alta. Como perdeu essa capacidade ficou muito fragilizado. Isso é seríssimo."

Petrobras é o espelho da economia

Cenário econômico faz com que empresas nacionais vejam suas margens serem corroídas

Cenário econômico faz com que empresas nacionais vejam suas margens serem corroídas


STOCKVAULT/DIVULGAÇÃO/JC
Os aspectos que fizeram o País regredir 33 posições no Relatório Global de Competitividade desde 2012 também têm impactado o desempenho de companhias estatais. A que talvez melhor represente esse cenário seja a Petrobras. Performance econômica, eficiência governamental, gestão e infraestrutura, que constituíram um ambiente de negócios hostil, também estão no cerne dos problemas enfrentados pela petrolífera.
No centro das investigações sobre um dos principais casos de corrupção investigados no País, a Petrobras encolheu nos últimos anos. Conforme demonstra o levantamento feito pelo Jornal do Comércio, as margens líquidas da companhia, que no primeiro semestre de 2011 eram de quase 20%, caíram para 0,36% no primeiro semestre deste ano.
O valor de mercado, que em 2010 era de R$ 380 bilhões, ficou abaixo dos R$ 100 bilhões no ano passado. Agora, a estatal volta a recuperar fôlego, já se aproximando dos R$ 200 bilhões, mas os desafios a serem enfrentados permanecem amplos.
Entre esses desafios estão questões de preço, já que a estatal tem sido afetada pelos valores internacionais da commodity e pela desvalorização cambial, e de gestão, levantadas, sobretudo, pelas investigações da Lava Jato. No relatório da administração de 2015 da Petrobras, um trecho foi dedicado exclusivamente a trazer esclarecimentos sobre os indícios de corrupção.
O documento sintetiza que a investigação aponta que "um conjunto de empresas, entre 2004 e abril de 2012, organizaram-se em cartel para obter contratos com a Petrobras, impondo gastos adicionais nestes contratos e os utilizando para financiar pagamentos indevidos a partidos políticos, políticos eleitos ou outros agentes políticos, empregados de empreiteiras e fornecedores, ex-empregados da Petrobras e outros envolvidos nesse esquema". O resultado tem sido a pisão e denúncia, ainda que em primeira instância, de ex-executivos da petroleira por lavagem de dinheiro, organização criminosa e corrupção passiva. Piora o quadro uma série de ações propostas nos Estados Unidos contra a Petrobras que requerem ressarcimento de perdas a investidores e que ainda estão em andamento, podendo levar a estatal a uma potencial perda nesses litígios.
Impactada, portanto, pela economia global e nacional, a companhia ainda batalha para corrigir deficiências na gestão. O caminho escolhido não é diferente do que os rumos que têm sido seguidos pelo governo federal: adoção de medidas para aumentar a eficiência da companhia, ampliação dos cortes de despesas, renegociação de contratos com fornecedores e reduzimos dos investimentos.

O mito da baixa produtividade

Você certamente já se deparou com a informação de que um trabalhador norte-americano produz mais do que um brasileiro. O dado que demonstra que a produtividade laboral nos Estados Unidos é quatro vezes superior à do Brasil, calculado com base na relação entre o PIB do país e o número de trabalhadores, não está incorreto, mas a interpretação dele também não pode ser feita de maneira tão simplista.
Em geral, as razões relacionadas à baixa produtividade estão alinhadas ao tempo de ensino e à qualidade da educação profissional. O que pouco se explora, no entanto, são condições de trabalho oferecidas pelas empresas. "Uma burocracia enorme consome o tempo do trabalhador brasileiro", explica o trader Alexandre Wolwacz. Esse desperdício de tempo está vinculado aos processos organizacionais. Uma reunião longa e mal conduzida, por exemplo, interfere diretamente na produtividade.
"Empresas mal estruturadas, com processos burocráticos lentos e que dependem de um serviço público que, em geral, também é burocrático e lento, contribuem com essa baixa produtividade", desmitifica. É claro que a educação é um ponto que impacta ainda mais o resultado, porém não é só a educação do funcionário que pesa. Os gestores também chegam mal preparados das universidades, lembra Wolwacz, sinalizando que nem nos cursos voltados para a direção e condução das empresas, como Administração, a busca da eficiência é trabalhada de maneira adequada. "Não temos centros de excelência em educação, como a Harvard Business School ou o Massachusetts Institute of Technology (MIT)."
Como resultado, gestores mal preparados conduzem empresas burocráticas, com processos lentos e pouco produtivas. No ambiente de negócios, isso se reflete no que Wolwacz chama de "canibalização das empresas", quadro em que as companhias passam por processos de redução ou de fusão para se manterem vivas. "Cada vez mais só ficará no mercado quem tem eficiência."
Outro efeito é que profissionais com as melhores formações têm buscado oportunidades em outros países. "A perda de capital intelectual que o Brasil teve nos últimos anos foi a maior tragédia para o País", lamenta.