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legislação

- Publicada em 01 de Setembro de 2016 às 16:12

Ministro do STF defende legalização da maconha

Para Barroso, é preciso pensar na questão sob uma perspectiva nacional, sem adotar modelos de fora

Para Barroso, é preciso pensar na questão sob uma perspectiva nacional, sem adotar modelos de fora


MARCELO G. RIBEIRO/JC
Um dos três únicos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) a ter votado até agora no Recurso Extraordinário (RE) nº 635659, que discute a descriminalização do porte de drogas para uso pessoal, Luís Roberto Barroso é, também, a favor da legalização da maconha. A votação pró-descriminalização está em 3x0, com votos de Barroso, Gilmar Mendes e Edson Fachin. Ainda faltam os pareceres de oito ministros.
Um dos três únicos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) a ter votado até agora no Recurso Extraordinário (RE) nº 635659, que discute a descriminalização do porte de drogas para uso pessoal, Luís Roberto Barroso é, também, a favor da legalização da maconha. A votação pró-descriminalização está em 3x0, com votos de Barroso, Gilmar Mendes e Edson Fachin. Ainda faltam os pareceres de oito ministros.
Iniciadas em 2011, as discussões sobre o RE não têm prazo para serem concluídas. A última novidade foi em junho deste ano, quando o ministro Teori Zavascki fez um pedido de vistas sobre a questão.
Entre os apoiadores da liberação das drogas, há os que são a favor da descriminalização (deixar de tratar como crime), despenalização (que o consumo deixe de ser passível de prisão) e legalização (não considerar o consumo como um ato ilícito). Barroso está entre os favoráveis ao terceiro caso, inicialmente através da liberação da maconha. "Isso não significa que eu apoio o consumo das drogas. Sou contra e passo isso para os meus filhos. Defender a descriminalização ou a legalização não é o mesmo que incentivar o uso de entorpecentes. Porém, fica a questão: os métodos utilizados no Brasil até aqui contribuíram, de fato, para desincentivar as drogas?", destaca.
Segundo o ministro do STF, as drogas têm sido combatidas há décadas através de penalizações e morte e, mesmo assim, o consumo aumentou exponencialmente ao longo dos últimos 40 anos, bem como o poder dos traficantes. "Ou vamos intensificar essa guerra contra o tráfico, se é que há ainda como intensificar, ou teremos que repensar essa guerra. Na minha opinião, a guerra está perdida", observa.
Para Barroso, é preciso pensar na questão das drogas sob uma perspectiva brasileira, sem o uso de modelos internacionais. "O poder do tráfico sobre as comunidades pobres, aqui, é de decisão de vida ou morte, uma opressão absoluta. Não é possível comparar com lugares como Uruguai ou Holanda, pois impede que as famílias vivam com honestidade, ameaçando, atraindo e pagando muito mais do que outros empregos possíveis", frisa.
A solução apontada pelo ministro, portanto, é quebrar o poder do tráfico descapitalizando-o, a começar pela maconha. A alternativa seria legalizar e vender o entorpecente em farmácias, onde seria possível monitorar a qualidade do produto e a quantidade que a população está consumindo.
No Brasil, conforme Barroso, 25% da população carcerária foi presa por crimes não violentos ligados ao tráfico, o que representa cerca de 150 mil detentos. A maioria é composta por "aviões", jovens de um dos níveis mais baixos da carreira de traficante, responsável por fornecer as drogas para as bocas e recolher o dinheiro dos traficantes de rua. "Quando é preso, recebe pena de bandido perigoso e, automaticamente, alguém o substitui na boca. O impacto no sistema do tráfico é zero e a vida daquela pessoa é destruída", revela.
O ministro usa o modo como o governo lidou com o vício em cigarro como exemplo de sucesso. "Conseguimos reduzir drasticamente o consumo com campanhas de conscientização, mesmo sendo uma droga legalizada. Podemos usar um trabalho nesses moldes com a maconha", sugere. Na opinião de Barroso, a legalização não necessariamente reduz o consumo, mas evita os efeitos colaterais da ilegalidade.

País precisa de educação, distribuição de riquezas e debate democrático

Para Barroso, um grande país se faz prioritariamente com educação de qualidade desde a creche, distribuição justa de riquezas, a fim de toda a população ter condições de participar da comunidade política, e debate público democrático de qualidade. "O Direito Penal é uma demanda social inevitável, pois a sociedade precisa elencar seus valores principais, como o direito à vida, mas não é ele, por si só, que vai solucionar o Brasil", observa.
A Justiça não é efetiva em crimes de colarinho branco, segundo o ministro do STF. "Se há pouco risco para quem se aventurar a entrar na criminalidade, que oferece alto retorno financeiro, o País vai criando uma geração de bandidos", pontua. A lentidão nos processos e a numerosa possibilidade de recursos para aqueles que têm condições financeiras de persistir o processo gera impunidade.
A ineficiência com crimes envolvendo a elite cria a situação que o Brasil vive hoje, em que "se prende muitos meninos por poucas gramas de maconha, mas não se prende por sonegação de milhões de reais em impostos", sob a ótica de Barroso. Assim, cria-se um país onde não vale a pena "ser decente" e que recompensa os piores da espécie, ensinando que "ser esperto é melhor do que ser bom".

Foro privilegiado desmoraliza o sistema

A existência de foro privilegiado para diferentes autoridades políticas, como presidente, vice-presidente, membros do Congresso Nacional, seus ministros e o procurador-geral da República, é considerada por Barroso como péssima para o Brasil. "Desmoraliza o sistema, da maneira como se dá. Talvez pudesse existir só para o presidente, o vice-presidente, chefes de Poder, talvez o presidente do STF, mas não para toda essa gente", opina.
O ministro do STF vê esse tipo de julgamento, realizado por um órgão específico, como retrógrado. Além disso, o STF não possui estrutura para julgar processos de foro privilegiado e todos os outros que chegam àquela instância. "Recebemos 100 mil processos por ano, tendo 11 ministros. Isso é antirrepublicano, porque não temos estrutura, então demoramos muito para julgar. Os números são pavorosos: levamos dois anos para receber uma denúncia, enquanto o juiz de 1º grau leva duas horas", ressalta. A morosidade já causou 59 casos de prescrição de crimes, desde o começo da atuação do Supremo.