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Teatro

- Publicada em 03 de Julho de 2016 às 15:52

Difícil e contundente, mas necessária

Porto Alegre está tendo a oportunidade de assistir, pela primeira vez, a um texto da dramaturga espanhola contemporânea Angélica Lidell - na verdade, Angélica González, cujo pseudônimo foi escolhido a partir da menina Alice Liddell, que inspirou Lewis Carroll a criar o personagem de Alice, no país das maravilhas. Angélica é filha de militar de carreira, catalã de origem. Na base de seus textos dramáticos, montados originalmente por ela mesma, através do grupo Atra Bilis, que criou em 193, granjearam-se premiações variadas, inclusive internacionais (Bienal de Teatro de Veneza, por exemplo). Com quase duas dezenas de textos montados, boa parte dos quais também editados, Angélica parece guardar a mesma solidão e isolamento que experimentou desde criança, mercê dos sucessivos deslocamentos que os pais sofriam, tendo em vista a profissão militar do pai (outro problema: militar catalão num mundo franquista...).
Porto Alegre está tendo a oportunidade de assistir, pela primeira vez, a um texto da dramaturga espanhola contemporânea Angélica Lidell - na verdade, Angélica González, cujo pseudônimo foi escolhido a partir da menina Alice Liddell, que inspirou Lewis Carroll a criar o personagem de Alice, no país das maravilhas. Angélica é filha de militar de carreira, catalã de origem. Na base de seus textos dramáticos, montados originalmente por ela mesma, através do grupo Atra Bilis, que criou em 193, granjearam-se premiações variadas, inclusive internacionais (Bienal de Teatro de Veneza, por exemplo). Com quase duas dezenas de textos montados, boa parte dos quais também editados, Angélica parece guardar a mesma solidão e isolamento que experimentou desde criança, mercê dos sucessivos deslocamentos que os pais sofriam, tendo em vista a profissão militar do pai (outro problema: militar catalão num mundo franquista...).
Dentre seus diferentes textos, no Brasil já foram montados pelo menos Eu não sou bonita, num festival de teatro em Salvador/Bahia, e Hysterica Passio, em São Paulo. Na capital gaúcha, desenvolve-se a temporada de O casal Palavrakis, parte do Tríptico da aflição, de 2001, em produção da Ato Cia. cênica, para as interpretações de Mariana Rosa e Paulo Roberto Farias.
Os textos de Angélica Liddell são contundentes e, por vários motivos, difíceis de serem concretizados em cena, ainda que isso não pareça ser assim. Há dois aspectos nesta dificuldade de encenação. Um decorre de certas exigências de montagem: por exemplo, em Eu não sou feia, há um cavalo em cena durante todo o espetáculo. Na montagem de O casal Palavrakis, utiliza-se um circuito fechado de televisão. O segundo aspecto de dificuldade para as montagens dos textos de Angelica diz respeito às exigências que se faz aos próprios atores. No caso da peça apresentada na Sala Álvaro Moreyra, um dos intérpretes é quase obrigado a engolir cerca de um quilo de arroz cru. Ao longo do espetáculo, ele também é melecado com quase um litro de iogurte, enquanto a atriz se vê em cena com figurino reduzido, apesar de todo o frio. Ambos são quase encharcados com água ao longo do espetáculo, de pouco mais de um a hora.
Os textos de Angélica funcionam um pouco como rituais de morte. Pelo menos as três peças aqui mencionadas têm, como ponto de partida, o fato de a personagem feminina, quando criança, ter sido violentada. Há outros textos seus que têm esta mesma referência ainda mais central. Elemento biográfico que moldou a visão de mundo da dramaturga? É uma pergunta evidente, mas para a qual não tenho respostas, a não ser que conhecesse mais profundamente uma biografia da artista. De todo o modo, abstraindo todas estas questões, até certo ponto externas à própria dramaturgia da catalã, o que propõe e discute ela?
Não há dúvida de que a dramaturga tem uma visão bastante pessimista da humanidade. Ela afirma que desconhece a dramaturgia mundial, não costuma ter contatos com os diretores que montam seus textos nem está preocupada com os comentários da crítica em torno de sua obra. Justifica sua posição dizendo que não pretende sofrer influências externas sobre sua dramaturgia, que para ela é seu modo de sobreviver. Aclamada mundialmente, nem sempre, contudo, o público a recebe com maior alegria, porque, realmente, seus textos não são nada digestivos ou fáceis ou simpáticos.
A montagem de Maurício Casiraghi é corajosa. Do mesmo modo, os dois intérpretes: porque se exige muito deles, e de maneira radical, sobretudo graças à proximidade física dos atores com a plateia. Suas respostas, contudo, são perfeitas. E o espetáculo que temos é tão dolorido e agressivo quanto admirável. A produção, do próprio diretor, exige dedicação e disponibilidade dos intérpretes: neste sentido, verdadeiro ato de amor para com o teatro. Contundente, difícil, antipático, não obstante, essencial, esta dramaturgia precisa ser conhecida. Felizmente, este jovem realizador teve esta ousadia, pelo que lhe devemos ser gratos.
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