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Saúde mental

- Publicada em 18 de Maio de 2016 às 21:49

Reforma psiquiátrica mudou situação no Estado

Primeira Caminhada da Rede de Atenção Psicossocial foi realizada ontem na Capital para marcar a data

Primeira Caminhada da Rede de Atenção Psicossocial foi realizada ontem na Capital para marcar a data


MARCELO G. RIBEIRO/JC
As pessoas que passam por tratamento de saúde mental seguem sendo estigmatizadas no século XXI e, muitas vezes, excluídas e deixadas às margens da sociedade. O preconceito, contudo, já foi bem pior - antes da promulgação da Lei Estadual da Reforma Psiquiátrica (nº 9.716), em 1992, o único caminho para pessoas que passavam por surtos psiquiátricos era em direção aos manicômios. A legislação deu tão certo que inspirou a Lei Nacional da Reforma Psiquiátrica (nº 10.216), vigente desde 2001.
As pessoas que passam por tratamento de saúde mental seguem sendo estigmatizadas no século XXI e, muitas vezes, excluídas e deixadas às margens da sociedade. O preconceito, contudo, já foi bem pior - antes da promulgação da Lei Estadual da Reforma Psiquiátrica (nº 9.716), em 1992, o único caminho para pessoas que passavam por surtos psiquiátricos era em direção aos manicômios. A legislação deu tão certo que inspirou a Lei Nacional da Reforma Psiquiátrica (nº 10.216), vigente desde 2001.
Vinte e quatro anos depois, o Rio Grande do Sul e o Brasil contam com uma Rede de Atendimento Psicossocial (Raps), com foco no cuidado em liberdade. A mudança de realidade foi tão grande que ontem foi celebrado, em todo o País, o Dia da Luta Antimanicomial.
Na época deputado estadual pelo PT, o autor da Lei Estadual da Reforma Psiquiátrica, Marcos Rolim, considera que, desde a aprovação da legislação, as diretrizes de saúde pública mental cresceram muito e contribuíram com a qualificação do sistema. "Naquela época, só havia manicômios. Era comum as pessoas serem internadas 30, 40 vezes, pois era tudo o que se previa em termos de tratamento de doenças mentais", recorda. Sem opções públicas, as internações ocorriam em âmbito privado, sendo lucrativas para as clínicas que ofereciam o serviço.
A partir da lei, o Estado passou a criar Centros de Atenção Psicossociais (Caps). Hoje, o Rio Grande do Sul, pioneiro na reforma psiquiátrica, também é o estado com o maior número de Caps proporcionalmente à população. "Há deficiências graves, especialmente em Porto Alegre. Deveríamos ter mais Caps, e mais leitos psiquiátricos em hospitais gerais", opina Rolim.
A internação em hospitais gerais, e não em hospitais psiquiátricos, é vista pelo ex-deputado como uma maneira de evitar estigmas. "Se alguém estiver com uma depressão grave e for internado no Hospital de Clínicas, ninguém vai taxá-lo de louco. Porém, se for encaminhado para o Hospital Psiquiátrico São Pedro, sim", salienta. Além de proteger o paciente do preconceito, o tratamento em hospitais gerais qualifica o atendimento às comorbidades relacionadas a álcool e drogas.
Enquanto a necessidade de internação para doenças mentais tradicionais foi diminuindo ao longo desses 24 anos, pois serviços preventivos foram adotados, a demanda por leitos para dependentes químicos aumentou. A definição de políticas públicas específicas para dependentes de crack, por exemplo, ainda é um desafio para o Estado, segundo Rolim. "Quando o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) reclama que a Lei da Reforma Psiquiátrica impede a abertura de leitos psiquiátricos, a entidade está se referindo ao tratamento contra a drogadição. Essa é a grande demanda atual, mas não é um problema tradicional da saúde mental. É um problema novo, ainda sem caminhos muito definidos para a recuperação", observa. Em sua ótica, uma solução possível seria o aumento de Caps específicos para álcool e drogas.
O período atual não é favorável a políticas visando ao cuidado em liberdade. Em 2015, o governo Dilma Rousseff instituiu o psiquiatra Valencius Wurch Duarte Filho, ex-diretor técnico do manicômio Casa de Saúde Dr. Eiras, do Rio de Janeiro, como coordenador nacional de Saúde Mental. "Visitei o espaço quando era deputado e era um horror. Eles usavam eletrochoques sem anestesia como medida punitiva", conta o ex-parlamentar.
No Estado, o atual coordenador de Saúde Mental, Luiz Coronel, tem histórico de trabalho no Hospital Psiquiátrico São Pedro, também um manicômio. "Esse é um retrocesso muito mais alto do que as pessoas imaginam. Faz parte da miséria da política brasileira", lamenta Rolim.
 

Servidores da Saúde de Porto Alegre defendem cuidado de pacientes em liberdade

Apesar de os gestores do Estado e do País na área de saúde mental terem um histórico conservador e não demonstrarem convicção na defesa da reforma psiquiátrica, a situação é diferente em nível municipal. "Quando o doutor Valencius foi nomeado, promovemos um abraço simbólico para afirmar a Raps e o cuidado em liberdade. Sabemos que há orientações divergentes em nível estadual e nacional, mas nossa posição é essa", afirma a psicóloga Letícia Quarti, da Coordenação de Saúde Mental da Capital.
Ontem, os servidores promoveram a 1ª Caminhada da Raps, com faixas, cartazes e esquetes teatrais. A rede de saúde de Porto Alegre conta com o auxílio de profissionais nos Centros de Atenção Psicossocial, nas equipes de Saúde Mental e Especializada de Saúde da Criança e do Adolescente, na oficina de saúde, geração de renda e trabalho, além de hospitais gerais onde existem unidades de internação. Atualmente, a Raps conta com 35 locais de assistência em saúde mental. Em 2015, foram 144.332 atendimentos.
Letícia relata que, na Raps de Porto Alegre, o usuário é tratado em seu território, sem ser segregado e estigmatizado. "A ideia é que a porta de entrada sejam as Unidades Básicas de Saúde, e que, a partir dali, a pessoa seja encaminhada para a rede de serviços especializada."