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Tecnologia

- Publicada em 17 de Abril de 2016 às 23:30

CPI reacende discussão sobre direitos na web

No dia 27 de abril será votado o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) de Crimes Cibernéticos. Dali sairão recomendações que poderão resultar em projetos de lei que, desde já, estão deixando alguns setores da sociedade em alerta.
No dia 27 de abril será votado o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) de Crimes Cibernéticos. Dali sairão recomendações que poderão resultar em projetos de lei que, desde já, estão deixando alguns setores da sociedade em alerta.
O Comitê Gestor da Internet (CGI.br), associações como a Proteste e o Instituto de Tecnologia & Sociedade do Rio (ITS) e até o inventor da World Wide Web, Tim Berners-Lee, demonstraram preocupação com o texto. "Algumas propostas desequilibram a balança do que foi alcançado depois de sete anos de discussão do Marco Civil da Internet", afirma o conselheiro titular do CGI.br eleito pelo terceiro setor, Thiago Tavares.
Uma primeira versão do documento, que tem como relator o deputado Esperidião Amin (PP-SC), foi publicada no dia 30 de março. O material contém recomendações, por exemplo, como a que obriga os provedores de internet a revelar para a autoridade de investigação, mesmo sem autorização judicial, quem está por trás de cada endereço de IP na rede, informando para a polícia o nome e filiação e endereço domiciliar da pessoa. A recomendação de que os provedores de aplicação deverão adotar medidas para impedir a disponibilização de conteúdo idêntico ou similar ao previamente removido também não foi bem-recebida por vários setores.
O texto da CPI aponta que o sistema atual é injusto com a vítima, pois as empresas dos principais aplicativos da internet removem apenas os endereços específicos apontados pelas decisões, o que obriga as pessoas a entrarem na justiça contra cada ocorrência. Diante disso, a sugestão da comissão é que seja apresentado um Projeto de Lei para que a retirada de conteúdos replicados seja automática, no caso em que decisão judicial já reconheceu a infringência do conteúdo. O CGI.br diz que essa medida é arriscada, pois "trata de um conceito de difícil precisão e com margem a interpretações subjetivas e até de prévia censura".
São temas polêmicos e, nos últimos dias, têm sido intensas as reuniões entre membros da CPI e de instituições ligadas ao mundo da internet para discutir o relatório. E isso já resultou em alterações no texto, afirma o deputado Esperidião Amin. "Não consideraremos mais o endereço do IP como equivalente aos dados cadastrais, mas ele poderá ser acessado sem ordem judicial em caso de investigação criminal já aberta", diz. Para especialistas, isso corrige uma distorção, pois o IP não pode ser equivalente a um CPF, por exemplo, já que cada máquina que uma pessoa utiliza possui um endereço diferente.
O trabalho da CPI, que realizou cerca de 120 audiências, não tem a intenção de criminalizar ou censurar a internet, afirma o deputado. "O número de crimes cibernéticos, o que inclui crimes contra a honra e o sistema financeiro, é avassalador. O que estamos buscando é reduzi-los já que muitos continuam acontecendo, mesmo com a existência do Marco Civil da Internet", relata.
Amin diz que existem gargalos que precisam ser resolvidos, como os que casos recentes no Brasil em que o WhatsApp não forneceu informações solicitadas pela polícia para a investigação de crimes que envolviam tráfico de drogas. Vale destacar que o Marco Civil, em seu artigo 12, já prevê punições para empresas que não estejam colaborando com uma investigação, que vão desde multa de até 10% do faturamento do grupo no Brasil até a suspensão temporária das atividades.

Desafio é equilibrar privacidade, liberdade e segurança

Patricia diz que é necessário evitar o crescimento do crime digital no País

Patricia diz que é necessário evitar o crescimento do crime digital no País


PATRICIA PECK PINHEIRO ADVOGADOS/DIVULGAÇÃO/JC
O direito vive um momento desafiador diante da pluralidade das questões que surgem do mundo digital. A grande questão, relata a advogada Patricia Peck Pinheiro, é conseguir alcançar um equilíbrio entre liberdade, segurança e privacidade, especialmente porque são direitos individuais e coletivos que se entrelaçam. "Tem momentos que também faz parte da liberdade garantir segurança pública. Não podemos deixar que o crime digital cresça", alerta.
Uma das polêmicas do relatório que evidencia essa dificuldade de consenso é a que obrigaria as empresas de internet a remover em 48 horas qualquer conteúdo considerado acintoso contra a honra. "O Congresso está prestes a votar leis que podem censurar internet. Essa CPI se reuniu para dar parecer sobre leis que criminalizam práticas na rede mundial, colocando a liberdade em risco", avalia o diretor executivo do ITS, Fabro Steibel. "O fato de um internauta poder ser processado se falar mal de um político vai deixar as pessoas com medo de se expressar", acrescenta.
Patricia comenta que isso, de fato, poderia levar à censura, já que um usuário pode falar algo sobre determinada pessoa, dentro da sua liberdade de expressão, e quem não quiser que isso se torne público tentar impedir. Ela observa, entretanto, que não dá para desconsiderar que o tempo necessário hoje para um indivíduo que tenha sido ofendido consiga uma liminar, geralmente, é longo, o que pode acabar causando danos a sua reputação.
Para o advogado especializado em crimes virtuais e em criminologia internacional, Antonio Gonçalves, o direito está sempre um passo atrás das evoluções do mundo digital. "A solução nesses casos é usar o bom senso e analisar como funciona o meioe tentar fazer conciliação de interesse para coibir a impunidade", sugere.

Para o Comitê Gestor da Internet, fazer mudanças agora é prematuro

As propostas contidas no relatório CPI de Crimes Cibernéticos, muitos delas com recomendação para a criação de projetos de lei, surgem antes mesmo que o Marco Civil da Internet tenha sido regulamentado. Esse instrumento, que contém os direitos e deveres do uso da internet no Brasil, levou cerca de sete anos para ser construído e votado e é considerado uma referência no mundo. "O mínimo que esperamos é que outras regulamentações respeitem o que o Marco Civil diz. Até porque, essa legislação trata de crimes, mas oferece direito à defesa na medida em que coloca o Judiciário como parte do processo", observa o diretor executivo do ITS, Fabro Steibel.
O CGI.br, entidade responsável por estabelecer diretrizes estratégicas relacionadas ao uso e desenvolvimento da internet no Brasil, avalia que essas novas propostas desconsideram todo o processo de construção colaborativa que resultou no Marco Civil e que manteve a internet livre, aberta e democrática. "Essa legislação está em vigor há um ano e é muito prematuro alterar o seu texto antes mesmo que tenha sido regulamentado e que tenha tido a sua plena aplicação", comenta Thiago Tavares, conselheiro do CGI.br.
O inventor da World Wide Web, Tim Berners-Lee, disse recentemente em carta aberta aos legisladores brasileiros publicada no site da The Web Foundation que "propostas que ameacem a neutralidade da rede ao fornecer novos poderes para bloquear aplicativos ou retirar conteúdo do ar são profundamente preocupantes, pois representam um duro golpe contra a liberdade de expressão on-line - em um momento em que a liberdade de expressão e debates profundos são mais necessários do que nunca". A advogada Patricia Peck Pinheiro observa que o Brasil saiu na frente ao criar o Marco Civil, mas é impossível conseguir em um único texto legal, esgotar esse assunto. "O debate e a atualização contínua, como por meio de rodadas de discussões e consultas públicas, são positivas", defende.