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Cinema

- Publicada em 17 de Março de 2016 às 22:34

A casa e a floresta

Hélio Nascimento
As fantasias humanas são as forças da criação de monumentos artísticos como também se encontram na raiz de comportamentos derivados da incompreensão diante da realidade. Elas podem, impulsionadas pela visão do real, decifrar enigmas e lançar luzes sobre espaços sombrios. Porém, também se encontram na base de comportamentos irracionais diante do mundo, quando não devidamente controladas ou elaboradas. O cinema tem, em sua história, grandes e significativos exemplos de obras que ilustram tal constatação. O mais notável desses capítulos talvez seja Psicose, o clássico de Alfred Hitchcock, onde o horror nada mais é do que o resultado de uma fantasia transformada em realidade brutal pela ausência de um processo de elaboração. Val Lewton, o produtor daquela série de filmes de horror realizada por vários diretores jovens, na década de 1940, teve a compreensão exata do tema, ao fazer de seus filmes de horror relatos nos quais a imaginação era a fonte do medo. E na medida que tais filmes nada mostravam de maneira explícita, transformavam o espectador em participante da trama. Mas também é possível ao cinema colocar-se no interior das fantasias, fazendo delas o roteiro para a criação de uma trama, como fez Murnau em seu Nosferatu, realizado em 1922 e até hoje a melhor versão do romance Drácula, de Bram Stoker. A bruxa, de Robert Eggers, mescla as duas tendências. Na medida em que em seu desenrolar predomina a imaginação dos personagens, o filme se alia à primeira corrente. E ao tornar explícitas, em alguns momentos, as distorções geradas pela fantasia, o filme se inclui entre os que se apropriam das sugestões proporcionadas pela incompreensão diante do real.
As fantasias humanas são as forças da criação de monumentos artísticos como também se encontram na raiz de comportamentos derivados da incompreensão diante da realidade. Elas podem, impulsionadas pela visão do real, decifrar enigmas e lançar luzes sobre espaços sombrios. Porém, também se encontram na base de comportamentos irracionais diante do mundo, quando não devidamente controladas ou elaboradas. O cinema tem, em sua história, grandes e significativos exemplos de obras que ilustram tal constatação. O mais notável desses capítulos talvez seja Psicose, o clássico de Alfred Hitchcock, onde o horror nada mais é do que o resultado de uma fantasia transformada em realidade brutal pela ausência de um processo de elaboração. Val Lewton, o produtor daquela série de filmes de horror realizada por vários diretores jovens, na década de 1940, teve a compreensão exata do tema, ao fazer de seus filmes de horror relatos nos quais a imaginação era a fonte do medo. E na medida que tais filmes nada mostravam de maneira explícita, transformavam o espectador em participante da trama. Mas também é possível ao cinema colocar-se no interior das fantasias, fazendo delas o roteiro para a criação de uma trama, como fez Murnau em seu Nosferatu, realizado em 1922 e até hoje a melhor versão do romance Drácula, de Bram Stoker. A bruxa, de Robert Eggers, mescla as duas tendências. Na medida em que em seu desenrolar predomina a imaginação dos personagens, o filme se alia à primeira corrente. E ao tornar explícitas, em alguns momentos, as distorções geradas pela fantasia, o filme se inclui entre os que se apropriam das sugestões proporcionadas pela incompreensão diante do real.
O Festival de Sundance, criado pelo ator Robert Redford, tem como objetivo prestigiar novos realizadores e que procuram concretizar propostas diferentes da rotina patrocinada pelos grandes estúdios. Tal mostra tem aberto espaço para realizadores de outros países e muitos diretores latino-americanos nela encontraram espaço e apoio. Foi em Sundance que Eggers foi pela primeira vez notado, pois parece que lá não existe preconceito com relação a gêneros e parece predominar a ideia de que não é apenas nos aspectos sociais mais evidentes que podem ser encontrados os novos talentos. E a consagração do cineasta de A bruxa é bem merecida. O cineasta revela um domínio da imagem e do ritmo narrativo perfeitos. Mais do que isso, ele sabe ver nos acontecimentos narrados a expressão de anseios e dores diante das normas repressivas e da incompreensão diante dessas leis disciplinadoras que afetam a natureza e consequentemente podem gerar respostas violentas e, no caso do filme, destruidoras daquilo que pretendem defender. E tudo isso é feito através de imagens, que suplantam a palavra e expressam o essencial. Desta história de pioneiros que vivem na Nova Inglaterra no século XVII, inspirada em relatos de jornais e documentos do período, o cineasta sabe extrair significados que terminam por dar consistência a um filme que recusa a vulgaridade que tanto tem frequentado o gênero de horror nos últimos tempos.
Se o objetivo é mostrar as consequências da repressão das forças da natureza, nada mais correto do que mostrar os animais exercendo a vingança. O coelho diante do qual o patriarca sofre um ferimento e o bode que se transforma numa força implacável e invencível são símbolos poderosos. E existe, também, a floresta, este cenário no qual os contos infantis colocaram criaturas ameaçadoras e que representa um mundo de fantasias e mistérios. O erotismo proibido, mesclado ao tema do incesto vetado pela civilização, aproxima o filme do Bergman de A fonte da donzela, que parece ser uma das admirações de Eggers. Mas o filme não se limita a apelos à imaginação do espectador: na sequência final se aproxima da origem de tudo, ao focalizar a dança das forças reprimidas e ao registrar o prazer da jovem ao participar do ritual.
OBS.: A omissão ao nome de Bergman no final da crônica sobre Meu amigo Hindu, na referência feita a Morangos silvestres, merece um pedido de desculpas. Mas a admiração de Woody Allen pelo cineasta sueco e pontos de contato entre as duas filmografias amenizam o descuido.
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