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CONTAS PÚBLICAS

- Publicada em 25 de Janeiro de 2016 às 22:29

Cadip auxiliou Estado a antecipar receitas


Em uma sala simples, instalada dentro do prédio da Fazenda estadual, uma empresa pública desempenha, quase anonimamente, uma função estratégica para as finanças do Rio Grande do Sul. Criada em 1995, a Caixa de Administração da Dívida Pública Estadual S.A. (Cadip) é pouco conhecida dos gaúchos, mas já virou referência para o setor público graças às operações que consolidou no mercado de capitais ao longo de sua história.
Em uma sala simples, instalada dentro do prédio da Fazenda estadual, uma empresa pública desempenha, quase anonimamente, uma função estratégica para as finanças do Rio Grande do Sul. Criada em 1995, a Caixa de Administração da Dívida Pública Estadual S.A. (Cadip) é pouco conhecida dos gaúchos, mas já virou referência para o setor público graças às operações que consolidou no mercado de capitais ao longo de sua história.
Com 20 anos de trajetória e 11 emissões de debêntures realizadas nesse período, a empresa captou mais de R$ 1,22 bilhão no mercado, dinheiro que já foi usado para antecipar o ingresso de recursos no Tesouro do Estado e para alongar o prazo de pagamento de débitos com fornecedores. Quem acompanhou cada uma dessas operações, desde o início, é o atual presidente da sociedade anônima, Leonildo Migon, que, na época da criação da Cadip, era o diretor de Relações com Investidores.
"Em meados de janeiro de 1996, menos de um mês depois da criação da empresa, ingressaram R$ 150 milhões", conta sobre o montante que a empresa conseguiu disponibilizar para o Tesouro Estadual em tão pouco tempo - a sociedade anônima tinha pouco mais de 15 dias de constituição. "Eu me lembro de ir buscar um cheque lá no Bndes."
O dinheiro fazia parte das primeiras operações realizadas pela empresa. O presidente detalha que a Cadip, constituída em 26 de dezembro de 1995, foi utilizada, inicialmente, para dar apoio ao programa de privatizações que se desenvolvia na época e que contava com o apoio do Bndes. "O objetivo das privatizações também era arrecadar recursos para os cofres do Estado, além de se desfazer de empresas que exigiam investimento e o Estado não tinha recursos para fazer", contextualiza, exemplificando que a Companhia Riograndense de Telecomunicações (CRT) se enquadrava nessa condição. "Era uma estatal que estava em dificuldades para acompanhar a evolução tecnológica do setor e que dependia de pesados investimentos, inviáveis de serem feitos pelo poder público."
A estatal recorreu às operações de mercado para antecipar as receitas das privatizações. Dessa forma, o Bndes liberou recursos para a Cadip, que se comprometeu a emitir debêntures que cobririam o valor creditado. "Nesse primeiro momento, fizemos algumas emissões com esse objetivo, de antecipar recursos de ações de empresas do Estado que seriam objeto de privatizações, como a CRT, privatizada integralmente, e a CEEE, que foi parcialmente privatizada."
Passado o período das privatizações, a Cadip manteve a sua atuação junto ao mercado, ainda por meio da emissão de debêntures, porém com características distintas. "Utilizamos a empresa para efetuar pagamento a fornecedores do Estado", resume Migon. Os credores, na época, eram empreiteiros que realizavam obras para o Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer), detalha. "O Estado não tinha recursos para efetuar os pagamentos, então a Cadip assumiu o polo devedor dessas obras." A estatal lançou debêntures que foram repassadas aos empresários. "Assim, os empreiteiros tinham na mão créditos que poderiam ser repassados a terceiros, como investidores institucionais, seguradoras, fundos de investimento e de pensão." 
Na prática, a operação conseguiu alongar o perfil da dívida do Tesouro, já que o cronograma de pagamento celebrado previa a liberação de recursos de acordo com os prazos estabelecidos na emissão de debêntures, para pagar em anos. "E isso aconteceu, rigorosamente. Nunca a Cadip atrasou sequer um dia o pagamento de compromissos junto aos credores das debêntures, em nenhuma das operações que realizou."

Estatal foi pioneira nas emissões lastreadas na dívida ativa


O lançamento de debêntures com lastro em parcelamentos tributários nasceu em solo gaúcho, em uma operação que foi concebida pelo atual presidente da Cadip, Leonildo Migon. Na época, em 2005, ele era diretor de Relações com Investidores, mas tinha um olhar treinado para o mercado de capitais. "Eu vim da iniciativa privada, tinha 20 anos de mercado de capitais, com experiência em Bolsa de Valores, investimentos e fundos de investimento", diz.
Migon recobra que, naquele período, ao analisar o balanço do Estado, percebeu que havia um ativo, proveniente de parcelamentos, enorme. "Não posso entender que o Estado tenha esses créditos todos a receber, com um mercado ávido por operações, e que a gente fique só contemplando essa prateleira de créditos tributários a vencer. É possível transformar isso em dinheiro imediatamente", disse ao então presidente da estatal, Ricardo Englert. Recebida como uma epifania, a declaração foi seguida de uma exclamação de Englert: "Bah, mas era disso que nós estávamos precisando!". Foi assim que surgiu a operação, que permitiria que os valores parcelados do ICMS que ingressariam no decorrer de um período de até três anos fossem disponibilizados imediatamente aos cofres públicos.
"Foi uma operação inédita não só no País, mas em toda a América", orgulha-se. Como a operação exigia a avaliação de rating, a Cadip precisou buscar uma agência que conceituasse o risco da emissão. "Na ocasião, nós operamos com a Moody's, sediada em Nova Iorque, que precisou buscar técnicos da Itália para fazer a avaliação, porque era a localidade em que essas operações ocorriam", acrescenta. "Nós nem sabíamos disso", exclama. "Foi considerada uma operação de livre negociação junto aos investidores."
Realizada em parceria com um pool de bancos sobre a liderança do Banrisul, a emissão teve como debenturistas fundos de investimento e de pensão, além de algumas seguradoras - apenas investidores institucionais. "Depois da Cadip, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e suas respectivas capitais ingressaram nesse ramo", elenca Migon, enfatizando que "hoje esse mecanismo é conhecido e aceito do mercado". Sobre as garantias, ele enfatiza que vêm dos próprios parcelamentos, criteriosamente controlados para gerar operações ajustadas tanto às necessidades do Estado quanto dos investidores. "Você emite R$ 1 mil em debêntures, mas oferece de R$ 1,5 mil a R$ 2,5 mil em garantias. Ou seja, eu recebo juros em cima de dois para pagar de um, que é uma remuneração um pouco maior do que a que eu recebo", demonstra. "Montamos a operação de forma tal para que não haja nem lucro, nem prejuízo."

Governo vislumbra oportunidade de retomar as operações no mercado

Nos últimos dias de 2015, a Assembleia Legislativa aprovou o aumento de capital da Cadip proposto pelo Executivo. Com um capital social de pouco mais de R$ 10 milhões e patrimônio de R$ 23 milhões, a estatal receberá mais R$ 230 milhões transferidos do governo. Os recursos, segundo o projeto de lei, são decorrentes de "passivo potencial do exercício anterior - Programa de Apoio ao Investimento (Proinveste-Bndes)".
O Executivo justifica que a medida visa atender às regras de mercado, que "aponta para a necessidade de as companhias emissoras, especialmente as de capital aberto, possuírem capital social compatível com o volume de operações realizadas". Como a Cadip desempenha um papel restrito à captação de recursos para serem repassados aos cofres públicos, a reportagem do Jornal do Comércio insistiu para que a Secretaria da Fazenda, a qual a Cadip é vinculada, concedesse mais detalhes sobre a origem do crédito e a perspectiva de emissão de títulos. Os questionamentos, no entanto, não foram respondidos.
O Bndes informou que o último contrato do Proinveste para o governo gaúcho foi firmado em dezembro de 2012, no valor de R$ 785 milhões. Possivelmente resíduo desse crédito, o aumento de capital da Cadip pode sustentar nova ida da estatal ao mercado, confirma Migon. "Estamos acompanhando o desfecho do programa de parcelamento do ano passado, que poderia viabilizar a emissão de debêntures já neste primeiro semestre. Porém, eu dependo de um rating que o mercado aceite e de uma condição de remuneração, de juros e de prêmio ao investidor, que seja viável."
Amanhã, a série detalha o processo de ingresso de Porto Alegre no mercado de capitais.