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entrevista especial

- Publicada em 27 de Dezembro de 2015 às 21:20

Cunha não passa de abril na presidência, diz Chico Alencar

 Entrevista especial com deputado federal Chico Alencar (P-Sol),

Entrevista especial com deputado federal Chico Alencar (P-Sol),


FREDY VIEIRA/JC
O deputado federal Chico Alencar (P-Sol-RJ) que liderou o processo que culminou com a abertura do processo de cassação do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) acredita que o peemedebista deve ser destituído do comando da Casa até abril. Cunha é acusado de mentir na CPI da Petrobras por ter negado possuir contas na Suíça, conforme apuraram as investigações da Operação Lava Jato.
O deputado federal Chico Alencar (P-Sol-RJ) que liderou o processo que culminou com a abertura do processo de cassação do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) acredita que o peemedebista deve ser destituído do comando da Casa até abril. Cunha é acusado de mentir na CPI da Petrobras por ter negado possuir contas na Suíça, conforme apuraram as investigações da Operação Lava Jato.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Alencar falou sobre os próximos passos do procedimento de cassação do presidente da Câmara e afirmou que Cunha vai continuar tentando barrar o andamento do processo na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Mesmo assim, acredita que ele vai ser cassado. Também avaliou o papel do Supremo Tribunal Federal (STF) no processo contra Cunha. O parlamentar do P-Sol sustenta que, antes do fim dos trabalhos no Conselho de Ética, o STF deve acolher o pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) de suspensão do mandato de Cunha.
Além disso, Alencar analisou o encaminhamento do pedido de impeachment contra a presidente da República, Dilma Rousseff (PT). Ele, assim como o seu partido, defende que não há motivos consistentes para cassar a presidente, embora seja "um governo muito ruim, sem iniciativa política, muito desgastado, com a credibilidade perdida". Para ele, o STF agiu corretamente ao invalidar a votação secreta que elegeu a chapa avulsa para a Comissão de Impeachment na Câmara dos Deputados. "O regimento da Casa não acolhe esse tipo de coisa (chapas independentes para as comissões). Tem que valorizar os partidos. Se os partidos têm divergências internas, têm que resolver internamente", sustentou.
Jornal do Comércio - Depois de várias manobras para postergar a decisão, o Conselho de Ética aprovou a abertura de processo contra o presidente da Casa, Eduardo Cunha. Quais os próximos procedimentos do processo de cassação do presidente Cunha?
Chico Alencar - A questão da admissibilidade do processo já foi aprovada. Para nós, é óbvio que o Eduardo Cunha quebrou a ética e o decoro parlamentar. Agora, ele vai tentar anular essa decisão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). De qualquer forma, a partir de fevereiro, quando os parlamentares voltarem do recesso, o Conselho de Ética vai continuar fazendo o seu trabalho, ouvindo testemunhas, inclusive as que Eduardo Cunha indicar, se quiser. Temos uns dois meses pela frente, se for um procedimento normal. Mas com o Cunha, nunca é. Acredito que, antes do Conselho de Ética, o Supremo Tribunal Federal, onde está o pedido de suspensão do mandato dele, feito pela Procuradoria-Geral da República, vá se pronunciar.
JC - Acredita que o STF vai acolher o pedido da PGR?
Alencar - As provas são muito robustas, os elementos são muito contundentes. Por isso, creio que vai acolher, sim. No mais tardar, até o final de abril, o Eduardo Cunha não será mais presidente da Câmara dos Deputados, pelo menos. Até porque ele tem usado o cargo para se proteger e defender, o que é uma ilegalidade. Por exemplo, os seus apoiadores na comissão fizeram manobras combinadas com ele para não dar quórum à sessão do Conselho de Ética: os deputados que o apoiam usavam o tempo de fala o máximo possível, até que o Eduardo Cunha abria a ordem do dia no plenário, e a comissão era obrigada a suspender os trabalhos. Por isso, deve ser, no mínimo, suspenso do cargo de presidente da Câmara.
JC - Eduardo Cunha disse que pretende entrar com um recurso no STF para tentar barrar a decisão do Conselho de Ética de abrir processo contra ele. A alegação é de que não teve o direito de ampla defesa garantido. Há chances de Cunha reverter a decisão do colegiado?
Alencar - Isso é uma piada de mau gosto. Ele usou e abusou dos instrumentos que tem para se defender. E agora vem dizer que está sendo prejudicado? Isso, na verdade, é mais uma manobra protelatória. Ele protelou ao prazo máximo o envio da representação do P-Sol e da Rede para o conselho. Depois, ele e sua tropa de choque usaram todas as possibilidades protelatórias possíveis e imagináveis, inclusive com a retirada de quórum. Além disso, nas oito reuniões do conselho até agora, ele nunca apareceu para se defender. Em vez disso, mandou advogados, porque, no fundo, sabe que seu caso é indefensável. Enfim, como dinheiro não lhe falta, prefere se defender através de uma bancada, imagino, regiamente remunerada. A origem do seu dinheiro todo é que falta ser esclarecida à sociedade brasileira. Consideramos que ele não tem mais legitimidade política, nem moral para continuar presidindo a Câmara dos Deputados. Nem para decidir sobre o processo de impeachment, a que ele acabou dando andamento.
JC - Cunha sempre disse que, se ele caísse, "não cairia sozinho". O encaminhamento do processo de impeachment, pouco antes de o Conselho de Ética aprovar a abertura de processo contra ele, foi uma demonstração disso?
Alencar - Em primeiro lugar, quando o presidente da Câmara dos Deputados usa o instrumento constitucional mais grave da nossa dinâmica política o impedimento de um presidente eleito com o objeto de fazer chantagem, o que está em jogo não é o mérito em si da questão, mas sim o toma lá, dá cá. Houve uma tentativa de chantagem por parte do Cunha: "se eu tiver o apoio da base do governo, que em tese tem maioria no conselho, não acolho os pedidos de impeachment; se não, castigo a presidente acolhendo o pedido de impeachment". Como não conseguiu apoio, encaminhou o processo daquele jeito autoritário. Fazer disso um objeto de chantagem, saindo totalmente da análise política da questão, é vergonhoso. É algo grave no processo político. É o suprassumo da política mais rasteira e baixa possível. Revela bem o que é o presidente da Câmara. Ele opera nesse toma lá, dá cá.
JC - A votação secreta que culminou com a eleição da chapa alternativa para a Comissão de Impeachment acabou sendo barrada no STF. Como avalia a eleição da chapa alternativa?
Alencar - A indicação para as comissões - inclusive para a de Impeachment sempre foi feita a partir das bancadas ou dos blocos partidários. Essa é a norma, a regra. Isso serve até para calcular proporcionalmente a estrutura da direção, quantos servidores vão trabalhar para cada partido etc. Você não pode se eleger avulsamente. Tem que estar em um partido. Isso é saudável, é bom, é democrático. Se os partidos têm divisões internas, eles que resolvam internamente. Durante a escolha dos membros da Comissão de Impeachment, a reclamação que eu mais ouvi, principalmente da ala do PMDB que lançou a chapa avulsa, foi que as lideranças das bancadas não tinham indicado nomes equilibradamente, já que os partidos estão divididos em relação à cassação da presidente. Como na ocasião os líderes das duas maiores bancadas, o deputado Leonardo Picciani (PMDB) e o deputado Sibá Machado (PT), indicaram só nomes contra o impeachment, uma parte das suas bancadas se rebelou e começou a montar a chapa avulsa. Mas o regimento da Casa não acolhe esse tipo de coisa. Tem que valorizar os partidos. Imagino que agora, com a nova eleição para a Comissão de Impeachment, com voto aberto, teremos uma chapa mais representativa dos partidos.
JC - Existem motivos consistentes para o impeachment?
Alencar - Até agora, na visão do P-Sol, não há elementos que configurem o impedimento da presidente, por mais que o governo dela seja horroroso. Na nossa visão, houve um estelionato eleitoral: primeiro, o Brasil do qual ela falava não tinha nenhum sintoma dessa profunda crise em que está metido agora; segundo, ao ter chamado o (ex-ministro da Fazenda, Joaquim) Levy para sua equipe econômica, começou a fazer o programa do adversário (senador Aécio Neves, PSDB). Além disso, entregou o governo ao PMDB. Há até petistas insatisfeitos. Um governo muito ruim, sem iniciativa política, muito desgastado, com a credibilidade perdida. Isso significa que deve ser implodido e jogado fora? Para quê? Para botar o (vice-presidente da República) Michel Temer (PMDB), que não tem a simpatia mínima da população? Achamos que não. Na verdade, um governo fraco e sem liderança política não pode ser destituído apenas por isso.
JC - As pedaladas fiscais foram o principal argumento para o pedido de impeachment?
Alencar - A questão das pedaladas fiscais, com o parecer do Tribunal de Contas da União (TCU), me parece pouco consistente. Inclusive a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), junto com um grupo de juristas, decidiu que não tem elementos para a cassação da presidente nas pedaladas. Mas a conjuntura é dinâmica, e podem vir outras razões. No momento, o impeachment é uma decisão do Congresso Nacional. Mas, se os senadores e deputados federais fossem submetidos aos mesmos critérios rigorosos com que julgam a Dilma, a maioria deles também seria "impeachmada" a começar pelos presidentes das duas casas (Senado e Câmara dos Deputados).
JC - A mais recente pesquisa do Datafolha indicou uma melhora na taxa de aprovação da presidente. Além disso, as manifestações contra Dilma perderam força, reuniram menos pessoas. Como avalia esse cenário?
Alencar - As pessoas estão começando a analisar com mais cuidado o impeachment. A mesma pesquisa do Datafolha traz uma informação impressionante: metade dos ouvidos não sabe quem substituiria a Dilma em caso de impeachment e, quando informados de que seria o Michel Temer (PMDB), 58% consideraram que o governo dele seria igual ou pior que o da Dilma. Eu diria, então, que há essa perplexidade, misturada com desinteresse pela questão, neste momento. Muita gente considera que trocar Dilma por Temer é trocar seis por meia dúzia. Outro dado interessante dessa mesma pesquisa é que 83% dos ouvidos querem a cassação do mandato do principal protagonista do impeachment até o momento, o Eduardo Cunha. Veja como o quadro está embaralhado, muito embaralhado. Vivemos tempo de grandes indefinições.
JC - A oposição ao governo petista no Congresso Nacional parece ter ganhado bastante força depois das eleições de 2014, o que causou várias derrotas à base aliada. Na sua avaliação, qual a força da oposição no Congresso?
Alencar - Eu diria no plural, há oposições, dentro e fora da base aliada ao governo Dilma. Há uma oposição interna, que está insatisfeita, porque tem cargos no quinto e sexto escalões, que está frustrada com o não pagamento das emendas parlamentares, cruciais para manter o curral eleitoral e reproduzir mandatos nas suas regiões. Por isso, a base do governo raramente tem maioria no Congresso Nacional, mesmo depois da entrega de sete ministérios para o PMDB. Também existe a oposição de direita mesmo, a conservadora, que fica sonhando com os tempos do neoliberalismo absoluto, com a volta da era (do ex-presidente) Fernando Henrique Cardoso (PSDB). O núcleo dessa oposição que é minoritário, mas faz barulho é composto por PSDB, DEM e PPS. Eles têm uma pauta muito moralista. Só que, quando entram questões essenciais da corrupção estrutural no Brasil, como financiamento empresarial de campanhas, eles votam pela manutenção do financiamento de empresas. Isso porque eles são beneficiários desse sistema. E tem ainda a oposição de esquerda, feita basicamente só pelo P-Sol. Claro que a gente julga que é a oposição mais autêntica e consequente, apesar de também reconhecermos nossa debilidade. Mas dá para incomodar. Se não fosse por nós, quem diria, o Cunha não estaria no Conselho de Ética. Nem isso as oposições têm iniciativa para fazer. O PSDB, o DEM e o PPS só largaram o Cunha de mão depois de flertar muito com ele.

Perfil

Francisco Rodrigues de Alencar Filho conhecido como Chico Alencar nasceu no Rio de Janeiro, em 19 de outubro de 1949. Formou-se em História pela Universidade Federal Fluminense. Concluiu mestrado na Fundação Getulio Vargas sobre o Movimento das Associações de Moradores do Rio, do qual foi um dos líderes no início dos anos 1980. Lecionou durante mais de 20 anos em colégios da rede pública e particular do Rio e, depois, se tornou professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Na política, entre 1987 e 1988, dirigiu a Coordenadoria de Apoio ao Educando, da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, na gestão Saturnino Braga (PDT). De 1989 a 1996, foi vereador pelo PT. Em 1998, foi eleito deputado estadual, quando presidiu a Comissão de Direitos Humanos e foi vice-presidente da Comissão de Educação, da Assembleia Legislativa do Rio. Está no quarto mandato como deputado federal: foi eleito em 2002, 2006 e 2010 pelo PT; e, em 2014, reelegeu-se pelo P-Sol.