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Segurança

- Publicada em 23 de Novembro de 2015 às 22:18

Alta criminalidade não deve ser revertida no País até 2023

Acesso a armas de fogo e homicídios por policiais devem continuar

Acesso a armas de fogo e homicídios por policiais devem continuar


JOÃO MATTOS/JC
Nos últimos 35 anos, ocorreram cerca 1,5 milhão de assassinatos no Brasil, segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o que levou o País à condição de campeão mundial em homicídios. Jovens, negros e com baixa escolaridade são a maioria das vítimas. A naturalização da morte do outro chegou a tal ponto que uma parcela significativa da população concorda com o espetáculo de linchamentos em postes, agora apreciados na internet.
Nos últimos 35 anos, ocorreram cerca 1,5 milhão de assassinatos no Brasil, segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o que levou o País à condição de campeão mundial em homicídios. Jovens, negros e com baixa escolaridade são a maioria das vítimas. A naturalização da morte do outro chegou a tal ponto que uma parcela significativa da população concorda com o espetáculo de linchamentos em postes, agora apreciados na internet.
O cenário apresentado nas linhas acima foi o pano de fundo para a construção de um amplo trabalho, apresentado ontem pelo Ipea e realizado em parceria com diferentes instituições, que se dedica a propor ações de prevenção social e de segurança pública para o Brasil. O estudo Violência e Segurança Pública em 2023: Cenários Exploratórios e Planejamento Prospectivo também tem o objetivo de contribuir com o planejamento do governo federal na área.
Mesmo com a perspectiva de avanços em alguns setores, a publicação mostra que certas tendências dificilmente poderão ser revertidas até 2023, como a desigualdade social elevada, o fácil acesso às armas de fogo, o crescimento da criminalidade no interior do País, o alto número de mortes pela polícia, os problemas de governança na segurança pública e a alta sensação de insegurança. De acordo com o estudo, há uma mistura de condições que tendem a favorecer a manutenção da alta criminalidade no Brasil até 2023: população jovem, alta desigualdade social e alta prevalência de armas em circulação. Até 2022, não deverá ocorrer mudança significativa no perfil demográfico brasileiro, mantendo-se alta a proporção de jovens (15 a 29 anos) na população. Segundo estudo recente, um aumento de 1% na proporção de homens jovens (15 a 29 anos) eleva a taxa de homicídios em 2%.
O segundo ponto, a elevada desigualdade social, tem como um dos seus polos a pobreza. No Brasil, a maioria dos homens jovens pertence a famílias pobres. Em 2010, 51,4% das crianças de 14 anos viviam com renda domiciliar per capita de até meio salário-mínimo. Em 2012, 40% dos adolescentes de 15 a 17 anos e 27,8% dos jovens de 18 a 24 anos viviam com renda familiar per capita de até meio salário-mínimo.
Apesar de a desigualdade de renda ter diminuído, a desigualdade social continuará elevada nos próximos anos, pois um processo social de alteração das desigualdades é, em geral, lento, como tem sido no Brasil. Essa desigualdade de renda se reflete na desigualdade no acesso à educação, à saúde, à alimentação, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à cultura, ao saneamento básico, ao transporte e ao consumo. Em contrapartida, estudos sinalizam que o desenvolvimento social pode ter impacto sobre a violência. Um exemplo é o acesso à educação. Pesquisa recente indicou que o aumento de 1% da taxa de frequência escolar de jovens entre 15 e 17 anos reduziu a taxa de homicídios no Brasil em 5,8%.

Proposta é a criação de uma política democrática, garantista e efetiva

Diante dos muitos desafios, foram propostos 12 objetivos estratégicos pelo estudo do Ipea. Também são apresentadas sugestões para o aprimoramento e a construção de uma política de segurança democrática, garantista e efetiva. Como os recursos – humanos, financeiros e tecnológicos – são escassos, é fundamental a construção de cenários e sua análise, a fim de fazer escolhas e priorizar investimentos. Um dos autores da publicação, o coordenador de Estudos e Políticas de Estado e Instituições do Ipea, Helder Ferreira, ressaltou a importância de avançar no planejamento e discutir com a sociedade um plano nacional de segurança pública que contemple, não só homicídios, mas outros temas ligados à segurança.
“A integração das próprias polícias já está sendo debatida no Congresso Nacional. Na prevenção social, é preciso trabalhar com jovens em situação de vulnerabilidade social e com os egressos do sistema prisional, incluindo os que cumpriram medidas socioeducativas, tentando tirá-los da trajetória de crime”, destacou o coordenador do Ipea. Entre as soluções para a melhoria da segurança pública, o coordenador defende a revisão do Estatuto do Desarmamento. “Todos os estudos apontam que mais armas trazem menos segurança”, afirmou.
O estudo reforça a urgência de se avançar na política de segurança pública, tendo em vista os riscos da situação se agravar, seja para um estado de violência endêmica, seja para um estado policial. Para o diretor de pesquisa e análise de informação do Ministério da Justiça, Rogério Carneiro, a análise das tendências, das incertezas e dos principais atores de segurança pública e suas estratégias levaram a quatro cenários fictícios: de prevenção social, de violência endêmica, de repressão autoritária e de repressão qualificada.
O trabalho mostra que certas decisões podem contribuir para um futuro indesejável. “A opção por uma política mais repressiva, punitiva e encarceradora pode reduzir a nossa liberdade e aumentar a exclusão, sem reduzir as taxas de criminalidade. A repressão direcionada para as camadas populacionais mais vulneráveis socioeconomicamente cria um sentimento generalizado de injustiça, que acaba por esgarçar os vínculos sociais e apartar a polícia das comunidades”, ressaltou Carneiro.